Rev. bras. psicoter. 2022; 24(3):3-7
Roza TH. Hikikomori: isolamento social patológico no Brasil e no mundo. Rev. bras. psicoter. 2022;24(3):3-7
Carta ao Editor
Hikikomori: isolamento social patológico no Brasil e no mundo
Hikikomori: pathological social withdrawal in Brazil and in the world
Hikikomori: aislamiento social patológico en Brasil y en el mundo
Thiago Henrique Rozaa,b,c
Hikikomori é um transtorno psiquiátrico emergente descrito inicialmente no Japão na década de 1990, que corresponde a um estado de isolamento social grave e prolongado, geralmente não atribuível à psicose ou outras formas graves de psicopatologia1. Em termos de apresentação clínica, a vinheta típica de um paciente com hikikomori é de um homem jovem, na casa dos vinte aos quarenta anos, que ainda mora com os pais, não trabalha ou estuda, carece de conexões pessoais significativas com amigos ou parceiros românticos, e quem é fisicamente isolado em seu próprio quarto ou casa 1-3 . Anteriormente considerado um fenômeno cultural japonês, este diagnóstico tem sido relatado em vários países ao redor do mundo, inclusive no Brasil, sendo considerado um problema de saúde pública em partes da Ásia, com a prevalência da síndrome sendo de aproximadamente 2% em certas amostras comunitárias 2-5 .
Recentemente, proeminentes pesquisadores no assunto propuseram critérios atualizados para o diagnóstico de hikikomori6. De acordo com estes critérios, para ser diagnosticado com a síndrome, um determinado paciente deve atender a estas três condições: "a) isolamento social significativo em casa; b) duração do isolamento social contínuo de pelo menos 6 meses; c) prejuízo funcional significativo ou sofrimento associado ao isolamento social". Por definição, se o indivíduo sair de casa ou de seu apartamento quatro ou mais dias por semana, o mesmo não se enquadra na definição de isolamento social característico da condição. Além disso, em casos graves de hikikomori, a pessoa quase nunca sai de seu próprio quarto. Nos casos no qual o paciente apresenta esse padrão comportamental por um período entre 3 e 6 meses, o mesmo é diagnosticado como tendo pré-hikikomori 6 . Entretanto, considerando que hikikomori não pode mais ser vista apenas como uma síndrome cultural japonesa, muito tem se debatido acerca da necessidade de critérios diagnósticos e modelos explanatórios que considerem características universais da síndrome 2,7.
Comorbidades psiquiátricas, principalmente depressão maior e ansiedade social, foram relatadas em muitos pacientes com hikikomori, sendo que a síndrome também é associada a risco aumentado de suicídio.1,7,8 Entretanto, em muitos casos, o paciente não preenche critério de nenhum outro transtorno psiquiátrico além de hikikomori 1 . Além disso, comportamentos excessivamente dependentes de tecnologias e adições comportamentias, como gaming disorder e uso problemático de pornografia, foram implicados em muitos casos de hikikomori 7,8 . Estratégias de enfrentamento evitativas diante de estressores psicossociais, vitimização por bullying, acomodação familiar e ambientes familiares superprotetores são outros fatores reportados em casos de hikikomori 1,7,8 . Outro ponto a considerar é a possível influência da pandemia do COVID-19 nos casos de hikikomori. Considerando as medidas instituídas para o combate à pandemia, como distanciamento social e quarentenas, é possível hipotetizar que isso tenha levado ao aumento da prevalência da síndrome, bem como à piora da gravidade dos casos que existiam anteriormente.9 Deste modo, mesmo que não seja possível descrever relações causais entre os fatores acima e hikikomori, é essencial avaliar a presença deles quando investigar um paciente com suspeita da síndrome. Neste sentido, o Quadro 1 sugere um roteiro básico de avaliação inicial para estes pacientes.
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