Rev. bras. psicoter. 2013; 15(3):1-4
Gastaud M, Eizirik C, Costa CP, Krieger DV, Machado D, Torres M, et al. A Revista Brasileira de Psicoterapia em um mundo em transformaçao. Rev. bras. psicoter. 2013;15(3):1-4
Editorial
A Revista Brasileira de Psicoterapia em um mundo em transformaçao
The Brazilian Journal of Psychotherapy in a changing world
Marina Gastauda; Claudio Eizirikb; Camila Piva da Costac; Daniela Valle Kriegerd; Diogo Machadoe; Mariana Torresf; Pricilla Braga Laskoskig; Stefania Pigatto Techeh; Rafael Stella Wellauseni
Desde a criaçao da Revista Brasileira de Psicoterapia, em 1999, as realidades acadêmica, científica e clínica mudaram muito. Da evoluçao do modelo de bases teóricas ao rigor metodológico exigido para a produçao de conhecimento atual, os psicoterapeutas defrontaram-se com uma trajetória de incertezas quanto ao presente e ao futuro das suas práticas, com questionamentos ideológicos acerca da melhor forma de consolidaçao do conhecimento e com outras tantas adaptaçoes no cenário das publicaçoes. As revistas científicas passaram a buscar a ampliaçao das indexaçoes - medida útil para que produçoes intelectuais de qualidade atinjam cada vez mais leitores e para que todos os interessados possam ter fácil acesso a elas. A quantidade de revistas e jornais científicos cresceu vertiginosamente, o que possibilitou que basicamente qualquer material encontre um meio de veiculaçao. Para assegurar aos leitores algum grau de veracidade ou confiabilidade das informaçoes disponíveis, foram criadas ferramentas para medir a qualidade dos periódicos - qualis, fatores de impacto, etc. Diante deste cenário de transformaçoes, a Revista Brasileira de Psicoterapia também precisou e ainda precisa se adaptar, mas nao sem antes questionar-se: como fazer essa transformaçao sem deformar sua essência? Os moldes atuais das publicaçoes beneficiam os psicoterapeutas? Deveria a Revista ceder a determinadas exigências das plataformas de indexaçao que poderiam pôr em risco sua utilidade clínica? Nao temos respostas definitivas; por isso, a partir dessas perguntas, gostaríamos de tecer alguns comentários.
Tradicionalmente, a Revista Brasileira de Psicoterapia tem tido o papel de levar a público as contribuiçoes dos autores da nossa regiao, produzindo referências pertinentes para nossa comunidade para profissionais que aqui exercem suas atividades clínicas e suas investigaçoes. Assim, a Revista tem veiculado as ideias de grandes psicoterapeutas - contando com trabalhos de profissionais renomados do sul do Brasil, mas também com os de autores respeitáveis de diversas partes do mundo. A missao da nossa gestao centra-se justamente na busca de maior exogenia da revista, pela apresentaçao de contribuiçoes de profissionais de diversas abordagens que contemplem a realidade das psicoterapias nos diferentes lugares do Brasil e do exterior. Nao ceder à endogenia é uma tarefa árdua, principalmente quando contamos com autores locais com tantas contribuiçoes. Por isso, nossa Revista também seguirá valorizando as submissoes locais, de alunos e professores do CELG, da UFRGS e de instituiçoes gaúchas. Acreditamos que há uma dimensao cultural importante na prática da psicoterapia que torna vital a publicaçao de dados coletados e pensados em nosso meio. Paralelamente, estamos seguindo o trabalho de abertura da Revista iniciado na gestao anterior com vistas a torná-la uma ferramenta importante de consulta para psicoterapeutas radicados nas mais diferentes zonas geográficas. Para que mais autores possam contribuir com seu pensamento e para que a Revista seja representativa da psicoterapia exercida também em outros países, aceitamos submissoes em português, inglês e espanhol. Com a finalidade de que mais leitores se beneficiem dos materiais, a revista passou a ser bilíngue e é indexada nas plataformas Lilacs, Index Psi (Conselho Federal de Psicologia) e Sumários.org. Estamos no momento trabalhando para a obtençao de cadastro junto à SciELO, o que ampliará a visibilidade dos artigos publicados. Batalhamos, ainda, para aumentar a avaliaçao da Revista realizada pela Capes (atualmente B3 na Psicologia e B5 na Medicina).
Esses também foram os objetivos da maior parte das revistas da área da psiquiatria e da psicologia nos últimos anos. Para alcançar essa meta, muitos periódicos centraram suas publicaçoes em experimentos/estudos empíricos, fechando as portas para ensaios filosóficos, argumentaçoes teóricas, estudos conceituais. Os espaços para estudos de casos foram reduzidos, e as revisoes da literatura sao cada vez mais restringidas a revisoes sistemáticas. Novamente nos perguntamos: deveria ser esse o destino das publicaçoes em psicoterapia? Artigos originais sao apenas estudos qualitativos, transversais, longitudinais, ensaios clínicos? Qual espaço encontra para levar suas ideias a público um pensador que tenha algo relevante e original a dizer sobre uma teoria ou sobre sua prática? Nas revistas das ciências humanas e sociais, talvez. Isto posto, nao seria desejável que nossa Revista também pudesse receber tais artigos, mais livremente produzidos ou escritos com metodologia distinta, embasada em outros referenciais de ciência? Mas as pesquisas empíricas e as contribuiçoes das ciências da saúde? Nao sao elas vitais para a psicoterapia?
Apesar do desenvolvimento notório das mais variadas formas de intervençao para as doenças emocionais (desde práticas místicas até tratamentos psiquiátricos e neurológicos de base biológica fundamentados em evidências), as psicoterapias se mantêm como importante ferramenta para o alívio do sofrimento mental no cenário contemporâneo. O advento das psicoterapias baseadas em evidências tem acumulado provas suficientes acerca da sua efetividade para assegurar o seu lugar ao sol no rol de tratamentos indicados para os pacientes que padecem de enfermidades psíquicas, problemas comportamentais e conflitos emocionais.
Acreditamos, sem dúvida, na importância de incrementar a pesquisa em psicoterapia e de torná-la cada vez mais baseada em evidências. Como nos diz Kernberg1, como psicoterapeutas, temos: 1) obrigaçao científica de avaliar e desenvolver o conhecimento psicoterápico, 2) responsabilidade social de esclarecer à opiniao pública a respeito da eficácia dos tratamentos oferecidos; 3) necessidade de ampliaçao do limite e da efetividade desses tratamentos; 4) premência de justificar e assegurar os sistemas de pagamento das psicoterapias; 5) obrigaçao imprescindível de reforçar as relaçoes da psicoterapia com o mundo clínico e acadêmico. A psicoterapia propoe-se a ser um tratamento (nao apenas uma experiência humana) e, como tal, deve ser submetida ao rigoroso protocolo de pesquisas da área da saúde. Entretanto, o modelo médico nao nos parece ser o único capaz de beneficiar o exercício das psicoterapias. Se o conhecimento veiculado sobre a área ficar restrito à pesquisa empírica, corre-se o risco de reduzir, a fim de operacionalizar as investigaçoes, conceitos complexos. Estudos teóricos, investigaçoes conceituais e publicaçoes de casos clínicos têm auxiliado a prática psicoterápica de forma reconhecidamente contundente para serem abandonados, justamente por seu poder de captar a sutileza, a complexidade e a riqueza das interaçoes humanas. Alguns desenvolvimentos significativos para o processo psicoterapêutico vieram de inspiraçoes teóricas e clínicas e nao apenas das investigaçoes quantitativas e qualitativas.
Por isso, reconhecendo o grande potencial que tanto as pesquisas empíricas quanto as argumentaçoes teóricas têm para o esclarecimento e ampliaçao de questoes relativas ao exercício da psicoterapia, nossa Revista seguirá aberta a receber publicaçoes de medicina, psicologia, enfermagem, serviço social, educaçao física, filosofia, sociologia, antropologia, artes e de todas as áreas do conhecimento que tenham algo significativo a dizer sobre as diversas facetas do ser humano. Somos uma revista das ciências da saúde, das ciências humanas, das ciências sociais - enfim, somos interdisciplinares. Esperamos que os psicoterapeutas possam beber, através da Revista Brasileira de Psicoterapia, de todas essas fontes de sabedoria. A direçao do CELG, agradecemos pelo apoio constante. A Tanise Gonzalez e à Patrícia Azambuja, nosso reconhecimento pelo suporte administrativo. Ao professor Sidnei Schestatsky, idealizador da revista, nossa gratidao pelo diálogo sempre maduro e motivador. Aos nossos autores e revisores, agradecemos pelas valiosas contribuiçoes. Aos nossos leitores, esperamos que esta nova missao esteja a contento e nos colocamos à disposiçao para diálogo e reformulaçoes. A todos, boa leitura!
REFERENCIA
1. Kernberg O. (2008). A necessidade premente de ampliar a pesquisa na e sobre a psicanálise. (The pressing need to increase research in and on psychoanalysis) Livro Anual de Psicanálise, 22, 25-30. (Annual Book of Psychoanalysis, 22,25-30)
a. Psicóloga, doutora em Ciências Médicas: Psiquiatria, editora da Revista Brasileira de Psicoterapia
b. Psiquiatra e psicanalista, doutor em Ciências Médicas: Psiquiatria, diretor de publicaçoes do CELG
c. Psicóloga, mestre em Ciências Médicas: Psiquiatria, editora júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
d. Psicóloga, mestre em Ciências Médicas: Psiquiatria, editora júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
e. Psiquiatra, editor júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
f. Psiquiatra, editora júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
g. Psicóloga, mestre em Filosofia, editora júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
h. Psiquiatra, mestre em Ciências Médicas: Psiquiatria, editora júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
i. Psicólogo, mestre em Psicologia, editor júnior da Revista Brasileira de Psicoterapia
Correspondência
Marina Bento Gastaud
Rua Comendador Caminha 312/205 - Moinhos de Vento
90430-030 Porto Alegre (RS)
marinagastaud@hotmail.com
Submetido e aceito em 13/01/2014
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