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Revista Brasileira de Psicoteratia

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Rev. bras. psicoter. 2011; 13(3):11-13



Editorial

Revista Brasileira de Psicoterapia: uma história sobre a busca de um espaço para o diálogo, crescimento e integraçao

Brazilian Journal of Psychotherapy: About creating a space for dialogue, growing and integration

Sidnei S. Schestatsky*

 

 

Aproveitando o convite da Revista Brasileira de Psicoterapia, pretendo fazer um breve relato histórico do nascimento deste periódico no cenário nacional, que ainda nao havia sido registrado. A ideia original de editar uma publicaçao brasileira, até entao inexistente, que enfocasse preferencialmente conteúdos ligados à teoria e prática das psicoterapias, começou a ser gestada no início da década dos anos de 1990. Na época, recebemos a visita do professor Otto Kernberg para trabalhar conosco sobre transtornos graves de personalidade, um tema até entao pouco explorado no nosso meio. Otto e sua esposa, Judith Kernberg (também psicanalista), ficaram entre Porto Alegre e Gramado durante uma semana em 1989 e outra em 1991, e foi com eles que, em meio a conferências, seminários, supervisoes e conversas pessoais, começamos a discutir a ideia deste projeto editorial. Ambos tinham a convicçao da importância de se vincular a psicanálise e suas aplicaçoes a instituiçoes universitárias, tanto como uma forma de propiciar um desenvolvimento e um debate mais amplo e rigoroso dos seus conceitos e processos, como uma oportunidade de interagir de forma menos ideológica e mais acadêmica com modelos alternativos da mente e seu tratamento.

Kernberg já era o psicanalista mais citado na literatura internacional especializada da época (e continuou sendo atualmente) e havia desencadeado um vigoroso esforço de pesquisa na área da psicanálise, trabalhando na Columbia University com um grupo de estatísticos, psicólogos e pesquisadores metodologicamente rigorosos. Mais do que isto, habituara-se a conviver de forma cooperativa com outros profissionais nao-psicanalistas, como a Dra. Helen Singer Kaplan, pioneira em terapias sexuais e fundadora da primeira clínica para disfunçoes sexuais em uma escola médica dos EUA (em 1970, na Payne Whitney Clinic, parte do complexo do New York Hospital - Cornell Medical Center), de quem Otto era vizinho naquele grande hospital. Anos mais tarde (1995), em um encontro anual de médicos residentes do New York Hospital, Otto me apresentou pessoalmente à Dra. Marsha Lineham, entao reconhecida nao só como criadora da Terapia Dialético-Comportamental para comportamentos parassuicidas nos transtornos de personalidade borderline, como também a primeira autora a publicar evidências positivas de intervençoes psicoterápicas com estes pacientes1. O que mais me chamou a atençao naquele momento, além da personalidade forte e intensa da doutora Lineham, foi a sugestao de Otto de que tratasse de conhecer bem o modelo de intervençoes cognitivo-comportamentais dela, porque nós, psicanalistas, teríamos muito a apreender e refletir com ele.

A concepçao de que psicoterapias de diversas orientaçoes poderiam buscar espaços de diálogo em comum, com trocas de experiências, informaçoes e pesquisas que possibilitassem desfrutar de processos de mútua fecundaçao e de desenvolvimento científico, foi o que norteou a iniciativa de registrar o nome "Revista Brasileira de Psicoterapia" e vinculá-lo ao Centro de Estudos Luis Guedes, do Departamento de Psiquiatria da UFRGS, que agregava, desde a década de 1960, uma longa experiência no ensino e assistência psicoterápica. O objetivo principal da RBP seria o de se constituir em um foro de debates e intercâmbio entre colegas dedicados às psicoterapias em todo o Brasil. Por diversos motivos, no entanto, a RBP só começou sua carreira editorial efetiva cerca de uma década depois, com seu primeiro número publicado em 19992.

Após atravessarmos a desmentalizada "década do cérebro" dos anos de 1990, entramos no século XXI observando-se um intenso revigoramento da eficácia das intervençoes psicossociais no tratamento de pacientes com perturbaçoes emocionais. Isto se expressou nao apenas pelas recomendaçoes acadêmicas norte-americanas da reinclusao e ênfase, no currículo das residências em psiquiatria, de diversos modelosa de psicoterapia3, como também pelas crescentes evidências de sua efetividade na reduçao de quadros psicopatológicos4 e nas correlatas modificaçoes de estruturas cerebrais5. Por outro lado, o que nos interessa aqui é constatar o vigor igualmente renovado com que o ensino, assistência e pesquisa das psicoterapias, emergiu também em vários centros do nosso país.

Dentro desta perspectiva é com satisfaçao que ressaltamos a importância destes três números temáticos lançados pela RBP, em novo formato e inédito esforço de integraçao nacional, obtido pela sua editoria atual. Estes volumes traduzem, ao mesmo tempo, a diversidade de pontos de vista com que colegas brasileiros estao trabalhando nesta área e a criatividade e pluralidade de modelos no ensino das psicoterapias (entre outros, a psicoterapia interpessoal, psicoterapia de orientaçao analítica, intervençao cognitivo-comportamental, atendimento de crise). Finalmente, nossos leitores e colaboradores terao a oportunidade ímpar de conhecer, nestes números, que tipo de soluçoes e propostas centros brasileiros de excelência, como a UNIFESP, o HCPA (UFRGS), a UNICAMP, a PUCRS e Ribeirao Preto, estao desenvolvendo na geraçao de conhecimento e no ensino das psicoterapias.


REFERENCIAS

1. Lineham MM, Armstrong HE, Suarez A, Almond D, Heard HL. Cognitive- Behavioral treatment of chronically parasuicidal borderline patients. Arch Gen Psychiatry. 1991;48:1060-4.

2. Gomes FG. Palavra do Presidente do CELG. Revista Brasileira de Psicoterapia. 1999;1(1):9-10.

3. Mellman LA, Beresin E. Psychotherapy competencies: development and implementation. Academic Psychiatry. 2003;27(3):149-53.

4. Leichsenring F, Hiller W, Weissberg M, Leibing E. Cognitive-Behavioral Therapy and Psychodynamic Psychotherapy: Techniques, Efficacy, and Indications. American Journal of Psychotherapy. 2006;60(3):233-59.

5. Gabbard GO. Mind, Brain, and Personality Disorder. Am J Psychiatry. 2005;162:648-55.










* Doutor em Psiquiatria, Professor Associado de Psiquiatria - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil. Coordenador do Curso de Especializaçao em Psicoterapia de Orientaçao Analítica (UFRGS). Psicanalista, Professor do Instituto de Psicanálise da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre.

Departamento de Psiquiatria da UFRGS. Serviço de Psiquiatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Porto Alegre, RS, Brasil.

Correspondência
Sidnei Schestatsky
Av. Cristiano Fischer, 590/503
91410-000 - Porto Alegre, RS, Brasil
+55 51 99711865

1. Psicoterapia individual breve e de longo prazo, psicoterapia psicodinâmica, psicoterapia cognitivo-comportamental, psicoterapia interpessoal, psicoterapia de apoio, psicoterapia de grupo, casais e de família, intervençao em crise e uso combinado de psicoterapia e farmacoterapia.

 

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