Rev. bras. psicoter. 2011; 13(1):64-66
Eggers O, Egger S. Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno da Personalidade Borderline e Vencendo o Transtorno da Personalidade Borderline com a Terapia Cognitivo-Comportamental. Rev. bras. psicoter. 2011;13(1):64-66
Livros
Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno da Personalidade Borderline e Vencendo o Transtorno da Personalidade Borderline com a Terapia Cognitivo-Comportamental
Cognitive-Behavioral Therapy for Borderline Personality Disorder and Overcoming Borderline Personality Disorder through Cognitive-Behavioral therapy
Otelmo Eggers1; Samuel Egger2
Marsha Linehan. Porto Alegre: Artmed, 2010
Há muitas coisas para serem ditas a respeito dos livros de Marsha Linehan, Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno da Personalidade Borderline e seu par Vencendo o Transtorno da Personalidade Borderline com a Terapia Cognitivo-Comportamental, mas a primeira e mais importante é que o título talvez seja um tanto quanto enganoso. Apesar do modelo terapêutico neles apresentado, a Terapia Comportamental Dialética, ter sido desenvolvido com e para pacientes borderline e com tendências parassuicidas, ela é muito mais abrangente do que apenas essas duas condiçoes clínicas.
Ao longo de suas páginas, podemos ver que toda teoria, desde a definiçao do que vem a ser o transtorno borderline, bem como a estrutura do processo terapêutico e as estratégias comportamentais aplicadas, é fruto de anos de trabalho prático e intelectual, e que todos os seus elementos foram muito bem pensados. Outra coisa enganosa a respeito do livro é a autoria: Linehan, apesar de ser a única autora creditada, deixa sempre muito claro que nao teria chegado onde hoje se encontra se nao fosse pelas outras pessoas que a rodeiam, como os membros de sua equipe clínica na Universidade de Washington e suas pacientes, a quem ela dedica grande carinho e admiraçao, especialmente pela paciência que tiveram para com sua terapeuta enquanto esta se via às voltas com o desenvolvimento de uma teoria de psicoterapia mais adequada para as demandas que precisava atender.
Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno de Personalidade Borderline, apesar de ter sido traduzido para o português apenas em 2010, foi originalmente publicado em 1993, e hoje é considerado um clássico da literatura científica recente da psicoterapia, tendo influenciado muitos estudos e terapeutas desde entao. Quando foi publicado em 1993 (e também quando foi traduzido para o português pela editora Artmed ano passado), o livro que trouxe para o centro da discussao científica uma maneira antiga de pensar a psicologia, porém com uma roupagem nova: os conceitos e técnicas oriundas da Análise do Comportamento. Juntamente com outros autores, como Steven Hayes, Robert Kohlenberg e Mavis Tsai, Marsha Linehan capitaneia um movimento que defende que as psicoterapias procurem resolver seus problemas teóricos através da pesquisa básica fornecida pela escola do Behaviorismo Radical. É surpreendente ver como ideias antigas podem ser revitalizadas e ganhar uma nova importância quando inseridas em um novo contexto. Ao contrário de quase todos os ensinamentos dados nas faculdades de psicologia do Brasil, uma metodologia behaviorista radical de trabalhar na terapia nao faz do paciente um "rato branco", ou do terapeuta um experimentador frio: mantêm-se toda a intensidade afetiva, todo o envolvimento, toda a evoluçao pessoal sentida por ambas as partes envolvidas, e se soma a isto a clareza conceitual da Análise do Comportamento para a compreensao do processo e para o planejamento de intervençoes. Dentre os avanços conceituais mais recentes, o mais significativo é de Comportamento Governado por Regras, que, juntamente com o velho conceito de contingências ambientais, tem conseguido resolver a velha questao da "Natureza vs. a Criaçao" e integrá-las de maneira harmoniosa. Apesar do livro nao discutir esse conceito, fica claro para quem acompanha os últimos andamentos da pesquisa em psicoterapia que a ideia da Dialética de encontrar um ponto de equilíbrio entre dois extremos, e de incluir o que antes fora excluído, está firmemente baseada neles.
Ou, para aqueles que gostam de paradoxos, todos os avanços recentes em análise comportamental clínica sao baseados no ideal dialético, pois todos os modelos recentemente desenvolvidos, apesar de conceituarem de maneira distinta seus objetivos, deixam claro que têm como meta o que poderíamos chamar de "flexibilidade psicológica", a capacidade humana de, mesmo diante do sofrimento, dos pensamentos dolorosos e das emoçoes avassaladoras, viver uma vida guiada por valores escolhidos pelo indivíduo e plena de sentido. Em toda essa literatura, e especialmente em Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno de Personalidade Borderline, podem ser reconhecidos os ideais humanistas que norteiam todas as escolas de psicoterapia: tornar o indivíduo mais livre do que ele pensa ser.
E, de certa maneira, o que acontece no plano teórico da Terapia Comportamental Dialética é o mesmo que ocorre entre paciente e terapeuta durante uma sessao: coisas que antes estavam excluídas e causavam problemas sao investigadas e incluídas, criando, de duas teses opostas, uma nova síntese, mais completa e abrangente. Técnicas classificadas como humanistas ou psicanalíticas sao incorporadas ao repertório do terapeuta dialético, e, ainda que sejam fornecidas explicaçoes diferentes para seu uso, nao se descarta as contribuiçoes feitas por aqueles que vieram antes de nós. Pelo contrário, Linehan faz questao de mostrar quais foram suas influências e de agradecer a seus professores. Ao ler esses dois livros, vislumbramos mais uma vez a certeza de que, no fundo, as diferenças entre modelos teóricos concorrentes de psicoterapia nao sao tao importantes quanto as suas semelhanças, pois todas elas trabalham com o mesmo objeto - o ser humano em sofrimento - ainda que com nomes diferentes. Talvez ainda falte para a classe dos psicoterapeutas essa clareza, essa coesao, e Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno de Personalidade Borderline, ainda que nao seja a cura para todos os nossos males, pode ser considerado um passo muito grande na direçao de uma língua franca da profissao.
1. Psicólogo, Pós-graduaçao latu sensu em Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais, Universidade de Caxias do Sul.
2. Acadêmico de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Endereço para correspondência:
Otelmo Eggers
Av Júlio Castilhos, 1511 s 88 - Caxias do Sul - RS
Recebido em: 06/06/2011.
Aceito em: 10/06/2011.
artigo anterior | voltar ao topo | próximo artigo |
Rua Ramiro Barcelos, 2350 - Sala 2218 - Porto Alegre / RS | Telefones (51) 3330.5655 | (51) 3359.8416 | (51) 3388.8165-fone/fax