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Revista Brasileira de Psicoteratia

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Rev. bras. psicoter. 2022; 24(3):1-2



Editorial

A multiplicidade que habita nossa singularidade

Joana Corrêa de Magalhães Narvaez

 

 

A busca por equidade nos processos psicoterapêuticos deve considerar o reconhecimento das diferenças singulares e capacidades individuais, tendo em vista o acesso à justiça social. Se as psicoterapias evoluíram, a sociedade e sua expressão plural mais ainda. Há sempre um instigante descompasso entre a intervenção e a demanda pulsante, tensionamento que impulsiona a atualização dos protocolos de cuidado. As veias em que transcorrem os processos e a estruturação psíquica estão mais declaradamente sinuosas e singulares. É emergencial que os fenômenos sociais que condicionam e determinam a saúde mental sejam reconhecidos e incorporados na clínica e nos processos psicoterapêuticos, sobretudo considerando a heterogeneidade sociocultural humana.

A 3ª Edição de 2022 da RBP reuniu artigos que versam sobre equidade e saúde mental. Discutimos nessa edição temas ligados as transculturalidades que perpassam as psicoterapias, o traumático social sob a ênfase do racismo, desigualdade social, adultez emergente e saúde mental; os manifestos emancipatórios de pessoas surdas; os maus-tratos infantis, impactos e agravos na saúde mental de mulheres em situação de violência doméstica; também abordamos intervenções para comportamentos suicidas e autolesivos em adolescentes; além de novas perspectivas e nas psicoterapias em gays, lésbicas e no entendimento de fenômenos narcísicos. Tal curadoria de produções da literatura científica nos permite compreender elementos relacionados a saúde mental de grupos tidos como minoritários, mas que constituem um montante significativo do que nos compõe, considerando as singularidades que regem o sofrimento humano e suas especificidades terapêuticas. Culmina na estética imagética de um registro sensível: a arte da capa concentra a força solitária e incessante de dar borda social a si e transpô-la por espaços mais igualitários.

Reconhecer o diverso que habita em nossa singularidade é encontrar a subjetividade própria em sua camada mais densa e particular. Há que saber muito sobre si para entender que nunca apreenderemos o todo que nos constitui, e que muito que supomos sobre nós, em última instância, reluz parâmetros sociais que, paradoxalmente, nos reduzem e nos dão borda no exercício de existência. A opressão não condiciona somente a expressão pulsional, mas também produz sintomas que são enunciação disfarçada do que montante que nos constitui. Em um país concebido desde sua raiz de forma polietnica, multicultural, heterogênea e, também, repressora, a multiplicidade plural está na origem de cada um de nós e ignorá-la é colocar em exilio a si mesmo. Mais que isso, entender a multiplicidade de forma integral na camada individual, permite melhor reconhecê-la no esquadro social. Por sua vez, a compreensão das bases estruturais e vetores de vulnerabilidade que condicionam e assujeitam sujeitos a diferentes níveis de acesso e oportunidades sociais nos impulsiona a quiçá operar a partir de especificidades equiparativas em prol de um desenvolvimento pleno e pautado em direitos humanos essenciais.

Por fim, mas sem findar, me despeço sem ir, por que os encontros assim são- pulverizam, semeiam e seguem mesmo quando a gente não. Transcorridos mais de 2 anos no corpo editorial da Revista Brasileira de Psicoterapia levo comigo aprendizados, dinamismo científico, parceria com meus pares editores e admiração pelo Celg. Como em qualquer escrita, o desenredo é por desistência racional, sem nunca verdadeiramente desenlaçar no afeto.










Editora da Revista Brasileira de Psicoterapia

 

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