Rev. bras. psicoter. 2022; 24(1):31-48
Castagnaro ALP, Mombelli MA, Moura CB. Psicoterapia breve na intervenção de psicólogos e psiquiatras no Brasil: uma revisão integrativa da produção científica. Rev. bras. psicoter. 2022;24(1):31-48
Artigo de Revisao
Psicoterapia breve na intervenção de psicólogos e psiquiatras no Brasil: uma revisão integrativa da produção científica
Brief psychotherapy in the intervention of psychologists and psychiatrics in Brazil: an integrative review of scientific production
Psicoterapia breve en la intervención de psicólogos y psiquiatrías en Brasil: una revisión integrativa de la producción científica
Andréa Leite Prado Castagnaroa; Monica Augusta Mombellib; Cynthia Borges de Mouraa
Resumo
Abstract
Resumen
INTRODUÇÃO
A psicoterapia breve (PB) teve sua origem na abordagem psicanalítica e foi desenvolvida para atender à crescente demanda por saúde mental. Grande parte da literatura disponível atualmente faz referência à psicologia psicodinâmica de Freud em tratamentos de emergência. Braier1 aponta as especificidades da Psicoterapia Breve em relação à Psicanálise tradicional através do foco terapêutico, duração limitada, planejamento do tratamento, multiplicidade de recursos terapêuticos, posição mais ativa do terapeuta visando fortalecimento e ativação das funções egoícas do paciente.
Sabe-se, contudo, que, ao longo dos anos, publicações de outras orientações teóricas e metodológicas com ênfase na PB estabeleceram-se, tais como a utilização de técnicas de psicodrama em psicoterapia, métodos da terapia cognitivo-comportamental (TCC) e o método conhecido como EMDR (Eyes Movement Desensitization and Reprocessing)2.
No Brasil, a PB tem seus primeiros registros em nível institucional em 1954, quando a psicóloga Mathilde Neder, na Clínica de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, começou a tratar pacientes infantis com problemas ortopédicos. Suas intervenções caracterizavam-se por atender a objetivos determinados em um curto período de tempo. Há registros também de que ela foi ensinada e utilizada a partir da década de 1970, sob orientação de Eizirick (1984), no Ambulatório do Centro Psiquiátrico do Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul2.
De modo geral, independentemente do subsídio teórico que embasa a PB, ela é caracterizada por objetivos limitados relacionados às funções imediatas do indivíduo e metas modestas ou reduzidas quando comparadas com as psicoterapias tradicionais. Foco e temporalidade são eixos fundamentais da PB, mas as técnicas utilizadas podem mudar de acordo com a fundamentação teórica de cada abordagem3.
Fiorini4 caracteriza a PB como a psicoterapia do ego e entende que ela visa a compreensão psicodinâmica relacionada aos determinantes atuais da doença, descompensação ou crise, concomitantemente ao entendimento psicodinâmico da vida cotidiana. Deste modo, a PB deve considerar quais capacidades da pessoa encontram-se invadidas por conflitos e quais se acham livres deles, organizando os recursos dos indivíduos de forma maleável.
Gilliéron5, por sua vez, utiliza a associação livre e sua técnica baseia-se essencialmente na disposição do tempo e na relação face a face. O paciente deve indicar um tempo para que ele possa resolver suas dificuldades e o terapeuta deve dispor de atenção flutuante e suas intervenções devem oportunizar associações.
Ao estabelecer uma distinção sistemática entre psicoterapia de longa duração e PB, identifica-se que, na segunda, as características de focalização em torno de uma questão específica, os objetivos limitados e o prazo definido da terapia tornam-se evidentes. Ou seja, por convenção, o prazo máximo para uma PB é de um ano, podendo durar alguns meses ou algumas sessões. Muitos serviços estipulam o número de doze; outros, vinte sessões - o número é variável. Deste modo, quando previamente definido e acordado pelo terapeuta e paciente, o limite de tempo dá contornos à relação terapêutica6.
Importante considerar que a Resolução CFP 010/2000 do Conselho Federal de Psicologia regulamenta a atuação do psicólogo na Psicoterapia. Entretanto, a "psicoterapia" no Brasil não é prática privativa de psicólogos, podendo ser praticada por outros profissionais da área da saúde, que não utilizem o título de psicólogo. Recentemente, inclusive, foi publicada a Resolução CNRM NO. 34, de 2 de setembro de 2021 que a aprova a matriz de competências dos Programas de Residência Médica para área de atuação em Psicoterapia no Brasil.
O objeto de análise desta pesquisa converge para a intervenção em PB realizada por psicólogos e psiquiatras, independente da orientação teórica, a questões relativas à saúde mental visando contribuir com a Prática Baseada em Evidências (PBE), que tem por objetivo a utilização de resultados de pesquisa junto à prática dos profissionais na promoção de saúde8,9.
O surgimento da PBE foi influenciado por um conjunto de fatores científicos, sociais, econômicos e políticos, tais como interesse de pesquisadores, clínicos e associações profissionais em comprovar os resultados dos serviços prestados e assegurar a qualidade deles, maximizando a relação custo-benefício dos tratamentos10.
Um dos métodos de pesquisa utilizados na PBE é a revisão integrativa da literatura, pois permite a incorporação das evidências na prática clínica. Esse método tem a finalidade de reunir e sintetizar resultados de pesquisas sobre um delimitado tema ou questão, de maneira sistemática e ordenada, contribuindo para o aprofundamento do conhecimento do tema investigado, além de apontar lacunas do conhecimento que precisam ser preenchidas com a realização de novos estudos, favorecendo a elaboração de conclusões gerais a respeito de uma área de estudo em particular 10.
No campo das pesquisas em psicoterapias, acerca da avaliação de resultados de técnicas psicoterapêuticas, discute-se a diferença entre eficácia versus efetividade, explicitando que eficácia refere-se à testagem de um tratamento em situação experimental ou laboratorial controlada, sob condições ideais; ao passo que estudos sobre efetividade observam o efeito de um tratamento no mundo real, com pouco ou nenhum controle de variáveis, além daquelas do próprio tratamento11.
Diante disto, observa-se ser significativa a produção científica sobre Psicoterapias Breves (PBs) tanto na literatura estrangeira quanto nacional. Contudo, observa-se a escassez de revisões que ofereçam uma visão de conjunto dessa prática, abarcando inclusive suas diferentes possibilidades de intervenção por outra categoria profissional. Especialmente na última década, não foram localizados trabalhos publicados que apresentem análise em profundidade referente à evolução dos estudos brasileiros. Diante de tal realidade, julgou-se oportuno proceder um levantamento sobre as PBs no Brasil, procurando delinear o perfil de tendências atuais, perspectivas científicas da área, formas e contextos de aplicabilidade no intuito de avaliar as contribuições da mesma no aprimoramento das intervenções visando resolubilidade e o avanço do conhecimento científico.
OBJETIVO
Identificar, avaliar e sumarizar as evidências científicas disponíveis que demonstrem a caracterização da literatura científica sobre intervenções de psicólogos e psiquiatras em psicoterapias breves no Brasil.
METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão integrativa (RI) da literatura, método que tem por finalidade reunir e sintetizar, de maneira sistemática e ordenada, os resultados de pesquisas sobre delimitado tema ou questão. Neste estudo foram utilizadas seis etapas propostas: identificação do tema e elaboração de questão de pesquisa, estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos, definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados, avaliação dos estudos incluídos, interpretação dos resultados e, por fim, apresentação da revisão/ síntese do conhecimento12. A pergunta norteadora do estudo foi: Quais são os níveis de evidência dos estudos brasileiros sobre psicoterapia breve realizada por psicólogos e psiquiatras?
Foram incluídos estudos primários limitados às línguas inglesa, espanhola e portuguesa, independente do desenho metodológico, publicados entre 2010 e 2020. As publicações foram obtidas a partir das bases de dados PubMed, SCOPUS, PsycINFO e Lilacs. Utilizaram-se descritores controlados (Medical Subject Headings/
MeSH, APA THESAURUS, descritores em Ciências da Saude/DECS) e não controlados (Entry Terms).
Os operadores booleanos OR e AND foram adotados visando obter o maior número de estudos sobre a temática e para cada base de dados foi construída uma estratégia específica, aplicada nas bases de dados eletrônicas no dia 18/07/2020, com descritores e sinônimos combinados de várias formas conforme se segue:
PubMed: ((Psychotherapy, Brief) OR (Brief Psychotherapies) OR (Psychotherapies, Brief) OR (Psychotherapy, Short-Term) OR (Psychotherapies, Short-Term) OR (Psychotherapy, Short Term) OR (Short-Term Psychotherapies) OR (Short-Term Psychotherapy) OR (Short Term Psychotherapy) OR (Brief Psychotherapy) OR (Solution-Focused Brief Therapy) OR (Brief Therapies, Solution-Focused) OR (Brief Therapy, Solution-Focused) OR (Solution Focused Brief Therapy) OR (Solution-Focused Brief Therapies) OR (Therapies, Solution-Focused Brief) OR (Therapy, Solution-Focused Brief)) AND (Brazil)
SCOPUS: (("Psychotherapy, Brief") OR ("Brief Psychotherapies") OR ("Psychotherapies, Brief") OR ("Psychotherapy, Short-Term") OR ("Psychotherapies, Short-Term") OR ("Psychotherapy, Short Term") OR ("Short-Term Psychotherapies") OR ("Short-Term Psychotherapy") OR ("Short Term Psychotherapy") OR ("Brief Psychotherapy") OR ("Solution-Focused Brief Therapy") OR ("Brief Therapies, Solution-Focused") OR ("Brief Therapy, Solution-Focused") OR ("Solution Focused Brief Therapy") OR ("Solution-Focused Brief Therapies") OR ("Therapies, Solution-Focused Brief") OR ("Therapy, Solution-Focused Brief")) AND (Brazil)
PsycINFO: Brief Psychotherapy AND Brazil
Lilacs: Psicoterapia Breve AND Brasil
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