Rev. bras. psicoter. 2021; 23(2):89-103
Piva M, Cervieri L, Oliveira MEFR, Rovani VF, Pereira ALC, Scorsatto AS. Efeitos da pandemia do Covid-19 na saúde mental do gaúcho. Rev. bras. psicoter. 2021;23(2):89-103
Artigo Original
Efeitos da pandemia do Covid-19 na saúde mental do gaúcho
Effects of the Covid-19 pandemic on the mental health of the people of Rio Grande do Sul
Efectos de la pandemia de Covid-19 en la salud mental del gaucho
Maristela Piva; Lucas Cervieri; Maria Eduarda Foncharte Ranzzi de Oliveira; Vanessa Fontana Rovani; Anna Luzia Charrinho Pereira; Andressa dos Santos Scorsatto; Júlia Zeni Pires
Resumo
Abstract
Resumen
INTRODUÇÃO
Em dezembro de 2019 é identificado pela primeira vez em Wuhan, na China, o novo coronavírus1. Sem muitas informações, o mundo não deu a devida importância para a gravidade da doença. Em fevereiro de 2020, surge o primeiro caso de COVID-19 no Brasil, e em março, a doença passa a ser considerada uma pandemia. Quando se iniciou este estudo, meados de junho de 2020, já se registrava no Brasil 983.359 casos confirmados de Covid-19, totalizando 47.869 mortos*.
O surto do vírus de SARS-coV-2 (COVID-19) que teria começado na China, espalhou-se rapidamente pela população mundial, chegando a níveis pandêmicos. Os países, de modo a enfrentarem as consequências da contaminação na saúde e na economia, mobilizaram estratégias. Assim, a quarentena foi a principal forma de contenção da contaminação pela COVID-19, adotada em várias regiões do mundo, promovendo o isolamento e confinamento de muitas pessoas, e foi necessário o recrutamento de um grande número de profissionais da saúde para ajudar no enfrentamento da crise, o que fez com que a OMS reconhecesse a sua transmissão como uma pandemia2.
O desdobramento da pandemia do COVID-19, trouxe situações até então desconhecidas, como: o isolamento social, suspensão de atividades escolares, profissionais e afastamento do trabalho. De certa forma, muitas pessoas foram tomadas pela perplexidade, tocadas pelo medo, e por sensações difusas de estranheza e da percepção repentina de que a vida anterior tinha evaporado³. Enfim, tal contexto afetou toda a sociedade, ocasionado mudanças repentinas e extremas nos hábitos e na rotina das pessoas. Vivia-se um regime de excepcionalidade (que ainda se faz presente), e lidar com este novo, "este desconhecido", parecia angustiar a todos.
De acordo com dados da WHO (2020), citado por Faro et al.4 (2020), a pandemia da COVID-19 se caracteriza como a maior crise de saúde pública das últimas décadas, atingindo todo o mundo. A partir de dados do Ministério da Saúde (MS), citado Faro et al. 4 (2020), crises globais desta magnitude causam impacto direto na capacidade de enfrentamento na sociedade, causando perturbações psicológicas e sociais, variando na intensidade e na propagação. Tal autor elucidou que a pandemia da COVID-19 tende a aumentar a quantidade e gravidade de doenças mentais, pois a necessidade de cumprir com as recomendações dos órgãos de saúde para desacelerar o contágio do vírus, acaba por impactar diretamente na rotina, o que leva a estressores como: afastamento de amigos e familiares, incerteza quanto ao tempo de distanciamento, tédio, medo e outros. Deste modo, durante a pandemia do COVID-19, tanto o otimismo irrealista (a crença de que tudo dará certo), quanto emoções negativas (tristeza, angústia, medo) podem ser desencadeadas, como consequência da influência midiática em torno da pandemia, acentuando previsões distorcidas em relação à saúde e sendo possível observar comportamentos como a quebra do distanciamento social ou, por outro lado, uma preocupação exagerada com a situação.
Embora alguns estudos internacionais publicados já estivessem apontando para os impactos negativos que a pandemia estaria trazendo à saúde mental dos sujeitos, no Rio Grande do Sul especificamente este tópico ainda não tinha sido devidamente explorado. Ponderando que seria importante compreender esta realidade, é que surgiu o interesse por esta temática e, consequentemente, o desenvolvimento de uma pesquisa de campo. Indagar-se-ia que a pandemia e o isolamento social (um processo mais longo que o esperado) poderiam favorecer o aparecimento de sentimentos como: medo, desesperança, insegurança, preocupação, temor ao inesperado, ansiedade, entre outros. Diante disso, reconhecer e compreender os efeitos do COVID-19 na saúde mental, especificamente na população do Rio Grande do Sul, estado em que os pesquisadores vivem e, portanto, levantar subsídios para intervir nesta imbricada situação de saúde pública, norteou o presente estudo. Objetivou-se identificar quais poderiam ser os efeitos que a pandemia da COVID-19 estaria acarretando à saúde mental da população do Rio Grande do Sul. De forma mais específica, buscou-se levantar os sentimentos que poderiam estar sendo experimentados pela população rio-grandense durante a pandemia da COVID-19; hábitos ou comportamentos que pudessem ter se desenvolvido como resposta a este momento; assim como, os recursos utilizados pelos participantes para enfrentar/lidar com este período peculiar de suas vidas.
MÉTODO
A pesquisa de caráter quantitativa, foi definida por Cervo e Bervian5 (2003), como a pesquisa que observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos sem manipulá-los. Buscando conhecer os efeitos da pandemia do Covid-19 na saúde mental da população rio-grandense, o estudo com objetivos descritivos, teve um design de levantamento na coleta dos dados.
O instrumento para a coleta de dados foi um questionário online (Formulário Google), com perguntas de múltipla escolha, e também algumas perguntas abertas. A escolha pelo questionário online como uma forma de coleta de dados, foi definida pela possibilidade de levantar os dados de forma rápida, permitindo alcançar sujeitos de todo o estado do Rio Grande do Sul de forma abrangente, já que o contato presencial, devido ao contexto vivido, seria muito difícil. Barros e Lehfeld6 (1986), ponderam ainda que o questionário, ao garantir o anonimato, fornece mais liberdade nas respostas, com menos riscos de influência do pesquisador sobre as mesmas. Além disso, economiza tempo e recursos, tanto financeiros, quanto humanos, na sua aplicação.
Tratou-se, portanto, de uma amostra não-probabilística, e os sujeitos foram se inserindo no formato "bola de neve"7. A seleção da amostra se deu por conveniência, uma vez que os participantes foram convidados a participar de um questionário online, através de redes sociais como: Facebook, Instagram e grupos de Whatsapp (dos autores do projeto). Dois foram os critérios para a participação na amostra do estudo: 1- residir no Rio Grande do Sul; 2- ter idade igual ou superior a 18 anos. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), estava integrado ao questionário, como parte preliminar deste. Ao tempo em que se convidava, também se explicava os objetivos do estudo. Os sujeitos que não concordassem em responder, ou não se incluíssem nos critérios para o estudo, não seguiram o trabalho. Todavia, foram excluídos os sujeitos que não completaram o preenchimento do formulário. A coleta de dados, através de questionário online, ficou disponível de 20 de agosto a 20 de outubro de 2020. A amostra reuniu 1359 pessoas, maiores de 18 anos, residentes no RS.
A análise dos dados foi realizada de forma quantitativa, descritiva, quando se fez a análise das frequências e porcentagens nas respostas encontradas. O projeto de pesquisa foi encaminhado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Passo Fundo (UPF), com o CAAE: 34678820.1.0000.5342, e ao responder ao link do Google Forms, junto ao questionário da pesquisa, estavam as informações sobre o estudo (TCLE)**.
RESULTADOS
A pesquisa online obteve um total de 1359 instrumentos válidos. Dentre os respondentes, 100% são nascidos no Rio Grande do Sul. No entanto, 99,4% dos participantes residem no estado do Rio Grande do Sul. A amostra abrangeu sujeitos residentes de 117 cidades do RS. Destes, a grande maioria (42,2%) reside no município de Passo Fundo. Outras frequências dizem respeito a participantes de Porto Alegre (6,6%), Carazinho (6,4%) e Nova Prata (6,1%)***.
Tendo em vista que o questionário foi elaborado na cidade de Passo Fundo, e que uma parte significativa dos autores da pesquisa reside ou possui contatos no município, entende-se que as participações favoreceram as pessoas daquela localidade, bem como a capital do estado e cidades vizinhas ou próximas à Passo Fundo. Na tabela abaixo, descreve-se o detalhamento sobre os dados sociodemográficos dos participantes da pesquisa.
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