Rev. bras. psicoter. 2021; 23(2):27-34
Müller MR, Albuquerque GAe, Monnerat GR. Saúde Mental dos Acadêmicos de Medicina na Quarentena - isolamento e enfrentamentos individuais. Rev. bras. psicoter. 2021;23(2):27-34
Comunicaçao breve
Saúde Mental dos Acadêmicos de Medicina na Quarentena - isolamento e enfrentamentos individuais
Mental Health of Medical Students in Quarantine - isolation and individual confrontations
Salud mental de los estudiantes de medicina en cuarentena: aislamiento y enfrentamientos individuales
Manuela Rodrigues Müllera,b; Gabriela de Albuquerque e Albuquerquea; Giovana Rosa Monnerata
Resumo
Abstract
Resumen
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial de Saúde (OMS) vem se preparando para a possibilidade do enfrentamento de uma pandemia global de gripe desde 19991. Os surtos de Influenza A H5N1 na Ásia em 2003-2004 e de H7N3 no Canadá, também em 2004, levaram à atualização do plano de preparação para pandemia de gripe duas vezes, em 2005 e 20092 e desde 2005, o isolamento domiciliar e o distanciamento social têm sido sugeridos como estratégias a serem adotadas em estágios mais avançados de pandemias. A pandemia atual é a primeira experiência de implementação deste tipo de medida em larga escala.
É fundamental avaliarmos as diferentes consequências que tanto a pandemia, como suas medidas de enfrentamento (isolamento domiciliar e distanciamento social), podem vir a ocasionar em territórios e estratos sociais distintos. Enquanto alguns têm possibilidade de se isolar em casa e lançar mão de estratégias, tais como o "home office" (trabalho remoto) e utilização de equipamentos de proteção individual, outros, sobretudo os trabalhadores informais e profissionais de saúde, são atingidos diretamente, seja pela instabilidade econômica advindas do momento, seja pelos compromissos com o cuidado ofertado à população.
A experiência de epidemias e confinamento devido a quarentenas repercutem sobre o bem-estar e saúde mental das pessoas acometidas3. Estimativas indicam que entre um terço e metade da população exposta a uma epidemia pode apresentar alguma manifestação psicopatológica, se não houver intervenções de cuidado específicas para as reações e os sintomas e que considerem a magnitude da epidemia e o grau de vulnerabilidade da pessoa no momento3.
No caso dos profissionais de saúde, embora sentir-se pressionado possa ser uma experiência comum, é possível que estresse nesse momento de pandemia estejam aumentados4. Ao mesmo tempo, em que se espera que ajudem e cuidem das outras pessoas, estão expostos ao risco de adoecimento e podem estar preocupados com a saúde de suas famílias e colegas de trabalho. Mais ainda, a necessidade de deliberar sobre intervenções em presença de dilemas morais em um ambiente de trabalho em rápida transformação pode resultar em raiva, ansiedade e estresse3,5.
É fundamental entender as fontes específicas de ansiedade e medo para o desenvolvimento das abordagens de apoio aos profissionais de saúde. Em vez de propor abordagens genéricas para redução do estresse ou resiliência, o foco principal dos esforços de suporte deve ser a detecção e enfrentamento dessas preocupações5.
A experiência recente de acadêmicos, internos e residentes médicos também foi investigada6. A alta probabilidade de exposição no hospital para estudantes de medicina e a necessidade de economizar equipamento de proteção pessoal (EPI) superaram os benefícios educacionais da participação nos cenários de prática6. Estudantes se sentem ansiosos e vulneráveis em contexto de isolamento social, especialmente pelas mudanças nas condições de ensino, recomendações de saúde e pelo reconhecimento das implicações de suas decisões para familiares e outras pessoas. Concomitantemente, tais vivências disputam o desejo e o compromisso de cuidar dos pacientes6. Acompanhar como os alunos são afetados e quais estratégias são empregadas para elaborar os efeitos da pandemia e isolamento social são medidas importantes. A prática da medicina é um empreendimento inerentemente moral, cujo sucesso depende muito da integridade dos profissionais, pois enfrentam os deveres que o cuidar implica6.
Considerando os efeitos sobre a saúde mental na quarentena entre estudantes de profissões da saúde, esse trabalho teve como objetivo investigar quais recursos foram utilizados pelos estudantes de medicina da Faculdade XX - Rio de Janeiro. Espera-se que os resultados permitam conhecer melhor a realidade vivida na quarentena e possam informar as medidas de orientação, acolhimento e suporte aos alunos de medicina.
METODOLOGIA
Esse estudo se trata de um recorte de uma investigação maior a respeito dos efeitos da quarentena sobre a saúde mental dos acadêmicos. Realizou-se um estudo exploratório, observacional, com análise qualitativa, realizada com estudantes de medicina, do primeiro ao sexto ano, de uma faculdade de medicina do Rio Janeiro-RJ (privada).
A pesquisa foi divulgada por meio dos representantes de turma, redes sociais da monitoria de Psicologia Médica e coordenação da faculdade. E o recrutamento da amostra foi realizado por meio de disponibilização de questionário on-line (plataforma Google-forms), através dos endereços eletrônicos das turmas. Os questionários online foram enviados em agosto de 2020. 80 questionários foram devolvidos para análise. Considerou-se número suficiente para finalização do campo, dada a identificação de repetição e saturação das respostas apresentadas.
Os critérios de inclusão foram alunos cursando medicina no campus Presidente Vargas (Faculdade de Medicina Estácio de Sá), regularmente matriculados, entre o 1º e o 12º períodos. Os critérios de exclusão foram não concordar em participar da pesquisa e/ou não estar regularmente matriculado.
O instrumento utilizado para colher as informações foi um questionário semi-estruturado dividido em 4 seções (vide quadro 1). Pretendeu-se investigar como os alunos estavam vivenciando a quarentena, a influência sobre hábitos de estudo e atividades práticas, e, finalmente, a percepção de sofrimento psíquico e suas medidas de enfrentamento. Em relação a experiência de sofrimento psíquico, questionou-se se percebiam alterações que pudessem sugerir a presença de sintomas dos transtornos mentais comuns.
"Correr ao ar livre, ver filmes, ler livros".
"Gosto de tomar um sol de vez em quando, ler um livro ou ver séries. Tenho me dedicado a aprender violão."
"Só a terapia e o remédio. Sem ânimo para mais nada."
"Conversando e bebendo online com os meus amigos, é o que me faz melhor, inclusive psicologicamente."
"Cuidar e curtir meu filho."
artigo anterior | voltar ao topo | próximo artigo |
Rua Ramiro Barcelos, 2350 - Sala 2218 - Porto Alegre / RS | Telefones (51) 3330.5655 | (51) 3359.8416 | (51) 3388.8165-fone/fax