Rev. bras. psicoter. 2019; 21(3):1-12
Conte LTD, Hallberg SCM. Caracterização de Clientela em Comunidade Terapêutica Infanto-Juvenil. Rev. bras. psicoter. 2019;21(3):1-12
Artigo Original
Caracterização de Clientela em Comunidade Terapêutica Infanto-Juvenil
Characterization of Clientele in a Child-Therapeutic Community
Caracterización de la Clientela en una Comunidad Terapéutica Infantil
Luiza Tolardo Dal Contea,b; Sílvia Cristina Marceliano Hallberga,b
Resumo
Abstract
Resumen
INTRODUÇÃO
Comunidade Terapêutica (CT) é definida como técnica psicoterápica que enfatiza as influências ambientais e interpessoais na ressocialização e reabilitação do paciente1. A expressão CT foi utilizada pela primeira vez em 1929, nos Estados Unidos, pelo psiquiatra Harry Stack Sullivan. O termo foi popularizado somente na década de 50, devido à publicação do livro Social Psychiatry de Maxwell Jones, na Inglaterra2,3,4. Após a Segunda Guerra Mundial, na Europa, observou-se o surgimento de diversas CTs como uma tentativa de humanizar o trato com o doente mental, além de amenizar e/ou impedir os efeitos negativos da estruturação corrente do tratamento psiquiátrico2,4,5. O atendimento na modalidade de CT pode ser estruturado em vários espaços, como em hospitais psiquiátricos, em prisões, em escolas, em residenciais, entre outros3,6,7. Apesar das diferentes formas que uma CT pode constituir-se, há como elemento comum o princípio de que o ambiente é o fator terapêutico. Os profissionais de diferentes áreas que compõem a equipe, bem como a relação destes com o paciente, as técnicas escolhidas e a estrutura física onde ocorre o tratamento instituem um conjunto para a idealização de uma CT3,6.
Inicialmente, a CT era uma modalidade de atendimento para adultos. Conforme as outras técnicas de psicoterapia foram se ampliando e agregando recursos lúdicos para o acolhimento de crianças e de adolescentes, as CTs também foram fazendo esse movimento8. A nomenclatura Ambientoterapia é comumente empregada, no sul do Brasil e em outras localidades, como equivalente a CT infanto-juvenil9.Nesse sentido, Osório10 sugeriu que a Ambientoterapia para crianças e adolescentes possuía um caráter de "lar-clube-escola". Na visão do autor, a expressão "lar" referia-se à estrutura da CT, que precisa ser semelhante a do grupo familiar, visto que o intuito do acompanhamento é oferecer modelos de identificação mais saudáveis para o paciente. "Clube" remetia às atividades lúdicas e recreativas que são proporcionadas na Ambientoterapia e "escola" aludia ao espaço social característico da criança10. As atividades oferecidas aos pacientes, na modalidade de Ambientoterapia, são planejadas visando à autonomia, à organização do ambiente externo e à semelhança com a realidade cotidiana. A partir dessa lógica, a rotina terapêutica inclui atividades artísticas, domésticas, recreativas, psicopedagógicas, entre outras5, 9 ,10. A Ambientoterapia possui efetividade terapêutica para crianças com distúrbios evolutivos, psicóticos e neuróticos em crises10. Também é indicada em casos de problemas de socialização, agressividade, impulsividade, atrasos globais do desenvolvimento, entre outras condições que necessitam de um acompanhamento diferenciado daquele oferecido na clínica individual8, 10. Ainda é aconselhada para pacientes que apresentam características regressivas, que remetem a uma fragilidade egóica, fruto de relações objetais primárias falhas e, por consequência, requerem tratamentos especiais2,3,10,11,12.
Pesquisas sobre o perfil de clientela em CTs estão predominantemente relacionados ao tratamento de adultos no contexto do uso abusivo de drogas13,14,15,16,17,18,19. Há pouca literatura dedicada ao levantamento de dados terapêuticos envolvendo crianças em ambientoterapia9. O presente estudo objetivou caracterizar a clientela atendida na modalidade de CT infanto-juvenil de uma clínica-escola de Porto Alegre/RS, entre os anos de 2008 a 2017.
MÉTODO
Trata-se de um estudo quantitativo, descritivo e de corte transversal, realizado a partir de uma pesquisa documental20, 21. Foram consultados 49 prontuários de crianças que estiveram em atendimento, na modalidade de CT infanto-juvenil, entre os anos de 2008 a 2017, numa clínica-escola localizada em Porto Alegre/RS. As informações coletadas foram transcritas para o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS - 17º Edição) e receberam tratamento estatístico (frequência).
A consulta aos prontuários para fins do presente estudo, seguiu a Resolução n. 510, de 7 de abril de 2016, do Conselho Nacional de Saúde, que discorre sobre a ética em pesquisa na área de Ciências Humanas e Sociais22. Além disso, os responsáveis pelas crianças pesquisadas concordaram que os dados coletados fossem utilizados para fins de pesquisa, assinando um termo de consentimento livre e esclarecido.
As variáveis coletadas incluíram: sexo; idade; escolaridade; tipo de ensino frequentado pela criança (ensino público ou privado); busca por tratamentos anteriores à CT; fontes encaminhamento para atendimento; sintomatologia e hipótese diagnóstica. Também foram coletados dados referentes ao tempo de permanência em CT, tratamentos complementares a essa modalidade e tipo de encerramento dado ao atendimento. Essas informações foram retiradas tanto da ficha de triagem dos pacientes quanto das evoluções preenchidas pelas equipes de terapeutas.
O trabalho de CT da clínica-escola pesquisada baseava-se no referencial psicanalítico, combinado com manejos comportamentais. A equipe era composta por psicólogos, estagiários de psicologia, psiquiatra, assistente social, psicopedagoga e fonoaudióloga. O objetivo do tratamento era proporcionar um espaço terapêutico em grupo para crianças que demandavam maior atenção e tempo do que poderia ser oferecido em uma psicoterapia individual. Eram acolhidos pacientes de quatro a doze anos de idade, que demonstravam dificuldades de socialização e para seguir regras e limites. Esses pacientes também apresentavam história de impulsividade e agressividade, problemas de conduta e atrasos globais do desenvolvimento. As crianças atendidas eram agrupadas conforme faixa etária e nível de funcionamento mental, sendo ainda considerados outros critérios clínicos e desenvolvimentais. Os pacientes recebiam atendimento por duas horas e 45 minutos, duas vezes por semana. Nesse período, eram realizadas atividades diversas. Os pais desses pacientes também recebiam cuidado terapêutico através de grupos de apoio semanais ou acompanhamento individual.
RESULTADOS
Dos 49 prontuários consultados, a maioria era de pacientes do sexo masculino (87,8%), com idade variando entre 2 a 12 anos (M= 7,04; DP= 2,3). Conforme dados da Tabela 1, essas crianças estavam matriculadas entre a pré-escola e o sexto ano do Ensino Fundamental, sendo que a maior parte frequentava a pré-escola (26,5%). O ensino privado era frequentado por 65,3% desses pacientes pesquisados.
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