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Revista Brasileira de Psicoteratia

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Rev. bras. psicoter. 2016; 18(2):3-19



Artigos Originais

Adesao à técnica psicanalítica no processo de psicoterapia com uma paciente borderline

Adherence to the psychoanalytic technique with a borderline female patient

Paula von Mengden Campezatto1; Fernanda Barcellos Serralta2; Luísa Fernanda Habigzang3

Resumo

Este artigo tem como objetivo descrever e compreender um processo de psicoterapia, com foco na técnica psicanalítica.
MÉTODO: Realizou-se estudo de caso único sistemático com uma paciente diagnosticada com transtorno de personalidade borderline. As sessoes da dupla paciente-psicoterapeuta e das respectivas sessoes de supervisao foram gravadas e posteriormente analisadas. Para mensurar adesao à técnica, 13 juízas preencheram o Iasp (Instrumento para Avaliar Sessoes Psicanalíticas).
RESULTADO: Embora o tratamento seja aderido à técnica psicanalítica, na análise geral deste, nao se observa a clássica atitude analítica. A nao interpretaçao das resistências, aliada à atitude prescritiva, pode ter contribuído para a interrupçao prematura.
CONCLUSAO: Avaliar o processo pode auxiliar no desenvolvimento de técnicas mais efetivas com esse tipo de paciente.

Descritores: Psicoterapia; Processos psicoterapêuticos; Pesquisa; Psicanálise.

Abstract

This paper aims to describe and understand a psychotherapy process, focusing on psychoanalytical technique.
METHOD: A systematic case study was performed with a patient diagnosed as borderline personality disorder. The patient-therapist sessions and of their supervision sessions were recorded and analysed. To assess adherence to the technique, thirteen judges rated the IASP (Instrument for Evaluating Psychoanalytic Sessions).
DISCUSSION: Although the treatment is adhered to the psychoanalytic technique, the general analysis does not show the classic analytic attitude. The non-interpretation of resistance coupled with prescriptive attitude may have contributed to the premature interruption.
CONCLUSION: Evaluating process can assist in developing more effective techniques

Keywords: Psychoanalysis; Psychotherapy; Psychotherapeutic processes; Research.

 

 

INTRODUÇAO

As psicoterapias vêm sofrendo pressao para comprovar cientificamente seus métodos1,2. Pesquisadores têm buscado respostas sobre porque, para que e para quem a psicoterapia funciona. O porquê de a psicoterapia funcionar é a pergunta-chave dos estudos sobre processo terapêutico. Nesse âmbito, os estudos almejam oferecer subsídios para compreender fatores que influenciam a resposta ao tratamento. Contudo, as publicaçoes de pesquisas sobre processos em psicoterapia sao ainda incipientes, e a maior parte dos estudos avalia resultados3,4.

O processo das psicoterapias envolve fatores específicos e comuns. Os fatores específicos sao fatores da técnica que distinguem diferentes tipos de psicoterapia (como o manejo da transferência, na abordagem psicanalítica) e os comuns estao presentes em todos os tipos de psicoterapia, como aliança terapêutica, estrutura da situaçao terapêutica e como se organizam e se transmitem os conteúdos terapêuticos, por exemplo5. Décadas de investigaçao demonstram que os fatores comuns sao mais importantes para promover a mudança do que os fatores específicos6. No entanto, e estimativa do efeito dos fatores específicos pode estar subestimada pela carência de estudos que focalizem esses fatores e seu efeito na psicoterapia, bem como devido às limitaçoes dos delineamentos tipicamente utilizados nos estudos de processo-resultados7,8. Argumenta-se que para compreender a mudança em psicoterapia psicanalítica é necessário examinar múltiplas variáveis subjetivas por meio do tempo e, nesse sentido, o estudo de caso sistemático pode ser mais indicado do que delineamentos grupais9.

A psicoterapia psicanalítica baseia-se nos desenvolvimentos teóricos da metapsicologia psicanalítica aliados às adaptaçoes da técnica a pacientes, contextos e culturas diferentes da época em que a psicanálise foi criada. Fatores específicos, como neutralidade do terapeuta e interpretaçao da transferência e de defesas, por exemplo, nao necessariamente estao presentes da mesma forma em todos os casos, pois a sua adoçao como parâmetro depende da natureza da psicopatologia do paciente. A diferenciaçao entre o tipo de estrutura (e consequente funcionamento mental) deve ter repercussao direta na técnica utilizada, o que reforça a necessidade de investigar os processos de psicoterapias psicanalíticas com pacientes de diferentes níveis de funcionamento.

Pacientes borderline apresentam como característica o funcionamento frágil do ego, a difusao da identidade, o predomínio de mecanismos de defesa primitivos e o funcionamento mental no nível de processo primário, ainda que com manutençao do teste de realidade10. Fatores ambientais, como vivências de abuso ou negligência e a falta de um modelo de apego seguro, sao partes de sua etiologia11. Devido a essas características, esses pacientes geralmente requerem modificaçoes na técnica psicanalítica clássica12.

Verifica-se na literatura que a técnica para o atendimento dos pacientes borderline nao apresenta consenso na literatura. A adaptaçao à condiçao face a face entre paciente e psicoterapeuta, porém com proposta rígida do setting, frequência e intervençoes predominantemente do espectro interpretativo, foi proposta por Kernberg10. Baseada no modelo desse autor, a Terapia Focada na Transferência é uma modalidade manualizada de psicoterapia psicodinâmica dirigida a pacientes borderline que visa trabalhar as representaçoes do paciente e dos outros na medida em que surgem na interaçao com o terapeuta. O tratamento é estruturado de forma a controlar a atuaçao, sustentando-se no estabelecimento do contrato e na neutralidade do terapeuta11. Outra corrente é centrada na construçao do vínculo de confiança e compreensao baseado na criaçao de introjeçoes positivas que o ambiente materno fracassou em prover. Essa modalidade de adaptaçao da técnica tem como característica a utilizaçao de uma gama maior de intervençoes em detrimento das clássicas interpretaçoes, nas quais a presença de constância, cuidados e nao puniçao do terapeuta sao mais importantes do que o conteúdo das interpretaçoes13 [PVMC1], baseando-se na obra de Bion14 e Ogden15, entre outros. E, ainda, Bateman & Fonagy16 defendem uma modalidade estruturada de tratamento para pacientes borderline que tem como objetivo estimular o processo de mentalizaçao, ou seja, buscar compreensao de estados mentais do próprio indivíduo e de pessoas de seus relacionamentos sociais. Experiências de fragmentaçao na estrutura do self podem ser reduzidas pelo desenvolvimento da capacidade de mentalizaçao, assim como a habilidade de lidar com estados emocionais e o desenvolvimento de relacionamentos interpessoais. Assim, os autores apoiam a ideia de que interpretaçoes transferenciais nao devem ser utilizadas nesse tratamento. Tais modalidades, embora sustentadas empiricamente, geralmente nao sao ensinadas nos cursos de formaçao de psicoterapeutas em nosso meio, sendo pouco conhecidas entre psicoterapeutas nao familiarizados com a pesquisa em psicanálise.

Uma vez que os modelos de orientaçao psicanalítica nao sao unânimes a respeito da técnica e do processo ideal na psicoterapia com pacientes borderline, constata-se a necessidade de mais estudos do processo terapêutico de psicoterapias psicodinâmicas para conhecer melhor os elementos associados aos resultados terapêuticos. Seguindo esse propósito, este artigo tem como objetivo descrever e compreender um processo de psicoterapia de uma paciente com transtorno de personalidade borderline, com foco na técnica psicanalítica. Procura-se observar como os aspectos intrapessoais (funcionamento da paciente) interferem na adesao à técnica e no modo como se estabelecem aspectos interpessoais da dupla paciente e psicoterapeuta. Trata-se de um caso interrompido precocemente. Avaliar o processo terapêutico de casos que nao atingiram os resultados esperados pode auxiliar a desenvolver modos mais efetivos para ajudar esses pacientes a permanecer em tratamento, de forma a extrair deste o máximo de benefício.


MÉTODO

DELINEAMENTO


Estudo de caso único sistemático17.


PARTICIPANTES

Fez parte do estudo uma dupla paciente-psicoterapeuta e integrantes do grupo de supervisao clínica do caso. A paciente, Lara, era adulta jovem, solteira, empregada doméstica, ensino fundamental incompleto, com hipótese diagnóstica de transtorno de personalidade borderline, estabelecida pela psicoterapeuta e pelo grupo de supervisao. A queixa inicial era choro constante, sentimento de vazio, relacionamento conflituado com a mae, dificuldade em expressar sentimentos e baixa autoestima. Foi vítima de violência doméstica durante a infância (violência física, negligência e suspeita de abuso sexual). A terapeuta era psicóloga, com formaçao em psicoterapia psicanalítica, cinco anos de experiência na área. O grupo de supervisao clínica do caso foi conduzido por uma psicanalista experiente (supervisora) e contou com a participaçao de uma professorapesquisadora em psicologia e psicanálise, quatro psicólogas com experiência em psicoterapia psicanalítica (dentre elas, a psicoterapeuta do caso) e duas estudantes de psicologia.

Para fins deste estudo, as sessoes do tratamento e de supervisao constituem a unidade de análise. Descrevemos sucintamente ambos os contextos: os atendimentos psicológicos foram realizados em uma clínicaescola, após procedimento-padrao de triagem da instituiçao que verificou a indicaçao de psicoterapia psicanalítica. Essa triagem foi conduzida por psicóloga com formaçao em psicoterapia e experiência de dez anos na área. A indicaçao inicial foi de psicoterapia psicanalítica com a frequência de duas sessoes semanais; no entanto, devido a questoes laborais e financeiras, a paciente passou a ser atendida semanalmente no ambulatório da instituiçao parceira deste estudo. O tratamento teve duraçao de nove meses e consistiu em 25 sessoes marcadas, com o comparecimento da paciente em 13 sessoes. Essas foram gravadas em áudio e supervisionadas semanalmente. Nas supervisoes, as discussoes tiveram como base as gravaçoes em áudio das sessoes, as sessoes dialogadas realizadas pela psicoterapeuta e o diário de campo da mesma, com informaçoes complementares, tais como atrasos, faltas, comunicaçao entre as sessoes e sentimentos contratransferenciais. As 18 sessoes de supervisao foram gravadas em áudio e registradas através de relato escrito.


INSTRUMENTO

O Instrumento para Avaliar Sessoes Psicanalíticas (Iasp) avalia a adesao à técnica psicanalítica por meio do exame de sessoes transcritas ou gravadas em áudio, para verificar se estas podem ser consideradas psicanalíticas. É autoaplicável, sendo necessário que o juiz possua amplo conhecimento a respeito da teoria e da técnica psicanalítica, além de ter experiência em psicoterapia psicanalítica e/ou psicanálise18. Constituído por cinco itens, engloba os seguintes pontos: (A) natureza das intervençoes, (B) neutralidade do terapeuta, (C) realizaçao de interpretaçoes, (D) uso da teoria para compreensao do material e (E) aspectos da relaçao pacienteterapeuta (sendo o somatório de E1 - clima da sessao e E2 - atitude do terapeuta). O ponto de corte sugerido para considerar uma sessao como psicanalítica é =13, sendo 25 a pontuaçao máxima da escala (Almeida, 2010). Encontra-se em processo de validaçao no Brasil. Testes preliminares da versao final demonstraram boa confiabilidade (Alpha de Cronbach's = 0,8119 e PABAK = 0,831/p= 0,00920), apresentando apenas um fator, com todos os itens tendo participaçao relevante na sua composiçao18,19.


PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANALISE DE DADOS

A pesquisa seguiu procedimentos éticos, aprovada por Comitê de Ética em Pesquisa (Parecer 772.465). Após o convite e aceitaçao da participaçao pela paciente e pela psicoterapeuta, a gravaçao em áudio das sessoes de psicoterapia foi realizada na clínica-escola parceira deste estudo. A cada sessao realizada, a psicoterapeuta relatava, por escrito, o atendimento para ser utilizado na supervisao, também gravada em áudio. Todas as sessoes do tratamento foram transcritas literalmente.

As transcriçoes das sessoes foram distribuídas às 13 juízas voluntárias para avaliaçao por meio do Iasp, de forma que cada sessao fosse avaliada por duas juízas. Essas juízas possuíam no mínimo dez anos de experiência clínica (Md = 14,07 anos) e já haviam concluído curso de especializaçao em psicoterapia psicanalítica e/ou em psicanálise. O escore final foi calculado com a média das duas juízas. Quando houve discrepância no escore total entre as duas juízas, ou seja, a mesma sessao foi considerada psicanalítica por uma juíza e nao psicanalítica por outra, tal sessao foi enviada para uma terceira juíza. Isso foi realizado nas sessoes de número 3 e 25.

Para exame aprofundado da evoluçao do processo de psicoterapia, os áudios das sessoes foram ouvidos e as transcriçoes de todas as sessoes foram lidas, visando a uma integraçao com os resultados obtidos por meio do Iasp. Além disso, recorreu-se à gravaçao do áudio das supervisoes para compreender e explicitar momentos de maior ou menor adesao à técnica psicanalítica.


RESULTADOS E DISCUSSAO

O tratamento durou nove meses e consistiu em 25 sessoes marcadas, com o comparecimento da paciente a 13 sessoes (de números 1, 2, 4, 5, 7, 10, 12, 13, 14, 15, 19, 20 e 25). A Figura 1 apresenta a distribuiçao dos escores totais do Iasp em todas as sessoes do tratamento analisado. A maioria das sessoes (76,92%, n=10) está classificada acima do ponto de corte da escala (=13), sendo considerada de abordagem psicanalítica, com média de 14,96 pontos. Tal resultado permite considerar o tratamento em questao psicanalítico no que diz respeito à técnica da psicoterapeuta. No entanto, três sessoes (1, 5 e 20) se apresentam abaixo do ponto de corte, nao sendo consideradas aderidas à técnica psicanalítica.




Compreende-se que, no decorrer de um processo psicoterapêutico, é possível a ocorrência de períodos mais e menos aderidos à técnica por diferentes fatores, como, por exemplo, momentos da vida do paciente, pontos de urgência e questoes relativas ao campo que se configura entre a dupla paciente-psicoterapeuta. A primeira sessao do tratamento pode nao ser considerada psicanalítica por nao haver ainda o estabelecimento de um processo psicoterapêutico e estar mais focada na exploraçao da queixa e construçao da aliança terapêutica. Uma vez que a tarefa principal neste momento é conter os elementos que se apresentam no campo e esperar para oferecer ao paciente algo que ele possa compreender21, nao é esperado que sejam realizadas interpretaçoes ou outras intervençoes que aproximem o paciente de conteúdos profundos.

Constata-se que, embora o tratamento em questao seja considerado aderido à técnica psicanalítica, na análise geral, nao se observa a clássica atitude analítica, em que paciente associa livremente, trazendo sonhos ou outros conteúdos de sua história passada. As sessoes ocorrem face a face e é observada uma atitude ativa da terapeuta, convocando a paciente a organizar seu discurso e a refletir sobre os conteúdos trazidos às sessoes. Essa configuraçao do setting está calcada em uma das possibilidades de adaptaçao da técnica tradicional ao paciente borderline e à cultura dos dias de hoje.

Salienta-se que, embora fosse indicada a Lara uma frequência de sessoes maior do que a realizada, as sessoes eram marcadas semanalmente e comparecidas com frequência ainda menor. Esse pode ser um dos fatores associados à interrupçao precoce do tratamento. É possível conjecturar que a nao adesao da paciente à recomendaçao da terapeuta sobre a frequência das sessoes idealmente indicada revele baixa aceitaçao dos seus problemas e da necessidade de ajuda, dois dos fatores genéricos relacionados à mudança em psicoterapia5. A trajetória psicoterapêutica dos pacientes borderline é descrita como comumente tormentosa, pois demoram a procurar tratamento, e, quando procuram, costumam ter excesso de faltas às sessoes e impasses que podem levar ao abandono da psicoterapia22. Independentemente do diagnóstico, as taxas de abandono em psicoterapia sao geralmente altas, sendo que aproximadamente um a cada cinco pacientes interrompe o tratamento antes do término indicado ou previsto23. O desfecho do tratamento de Lara, portanto, nao é raro. A trajetória irregular do seu processo também nao.

A partir do resultado da avaliaçao das juízas (Figura 1), destaca-se a sessao de número 13 como mais aderida à técnica psicanalítica (escore total médio de 20,5), e a de número 20 como menos aderida à mesma (escore total médio de 4,5). Para melhor compreender o que determinou a maior ou menor adesao, essas sessoes serao analisadas descritivamente, em profundidade, e de acordo com os cinco itens que compoem o Iasp (Figura 2).




13ª SESSAO DE PSICOTERAPIA

Essa sessao foi considerada aderida à técnica psicanalítica pelas juízas por meio do Iasp, com elevada pontuaçao em todos os itens da escala. No clima geral da sessao pareceu existir um total entrosamento entre psicoterapeuta e paciente (item E1), de forma que a atitude da psicoterapeuta proporcionou momentos reflexivos ao longo de toda a sessao (item E2). As juízas avaliaram que nessa sessao a psicoterapeuta nao utilizou opiniao ou julgamento pessoal ou exemplos de sua própria vida, mantendo-se neutra também com relaçao a seus valores e teorias (item B).

É importante contextualizar que a 13ª sessao ocorre em meio a uma sequência de presenças da paciente (12, 13, 14 e 15), configurando importante marco no fluxo do trabalho terapêutico. Na supervisao dessa sessao, é referida pelo grupo a reduçao da sensaçao de que Lara pode interromper o tratamento a qualquer momento, e a psicoterapeuta percebe o fortalecimento da aliança terapêutica com a paciente. O grupo de supervisao refere irritaçao com a passividade e com as queixas da paciente, em contraste com a pena sentida nas sessoes anteriores. Esse processo é compreendido como necessário para o engajamento da paciente ao processo de mudança. Retoma-se que o sentimento contratransferencial de pena vitimiza Lara e a deixa sem chance de poder modificar sua própria história. Já a raiva se apresenta com movimento de vida, na tentativa de fazer com que a paciente possa sentir-se protagonista, capaz de escrever sua história atual e futura ativamente. Destaca-se trecho do grupo de supervisao:

"Lara lista o que pode fazer (trabalhar, estudar, fazer o curso) e diz que nao quer e nao consegue fazer nada (estudar, trabalhar). Como um bebê. Só quer mamar. Tem carências reais em sua história, mas para se desenvolver terá que sair da postura de pena de si, de pobrezinha, elaborando esse sentimento e lutando. [...] Se for uma coitadinha que nao pode nada, será provavelmente abusada, só receberá indiscriminadamente o que derem para ela."

Embora as juízas tenham realizado avaliaçao positiva dessa sessao, no grupo de supervisao, a psicoterapeuta afirmou ter dificuldades de relatar a sessao em seu diário de campo, considerando essa tarefa mais difícil do que com outros pacientes. Tinha a impressao de que eram sempre os mesmos assuntos, confundindo-se com a ordem dos mesmos, embora se sentisse mais conectada com a paciente durante os atendimentos. O tipo de funcionamento de Lara necessita ser considerado, o qual costuma gerar aspectos contratransferenciais dessa natureza. O discurso da paciente se apresenta muitas vezes desorganizado, com associaçao caótica de ideias. Por ser difícil traduzir a qualidade afetiva do discurso de pacientes borderline, é importante o uso da contratransferência24. Os sentimentos da psicoterapeuta remetem à necessidade de convocá-la a pensar e a atribuir nome ao que sente.

Na vinheta a seguir, a psicoterapeuta procura auxiliar a paciente a compreender que nao estava conseguindo matricular-se no curso por necessitar de uma figura cuidadora/materna (empregadora) que a acompanhe nessa tarefa:

T - E o que tu pensa sobre fazer esse curso? O que te interessou nesse curso? [...] E será que isso te motiva a acabar o segundo grau?

P - Pois é.
[...] Acho que eu teria que começar, mas é difícil... Só de pensar que eu vou ter que estudar matemática de novo...

T - É, dá um trabalho se a gente quer resultado.

P - É... Mas eu tô tentando, vamos ver se agora eu consigo ir logo lá.

T - Acho que dá uma vontade também, às vezes, de ser um pouco cuidada...

P - É.

T - ...de querer que a
[empregadora] te leve no curso, te busque, que ela nao te dê tanto serviço, consiga cuidar de ti...

As juízas avaliaram que a psicoterapeuta realizou vários tipos de intervençoes, entre elas interpretaçoes, perguntas, assinalamentos, confrontaçoes, esclarecimentos, além de orientaçoes e combinaçoes (item A). Essa variedade de intervençoes está de acordo com a adaptaçao técnica para o atendimento de pacientes regressivos como Lara, embora muitas vezes questione-se o real aproveitamento da paciente. Percebeu-se que a psicoterapeuta utilizou a teoria psicanalítica na elaboraçao das intervençoes, abrangendo a compreensao da transferência/contratransferência, do padrao de relacionamentos fora da sessao, de relaçoes entre a história atual e passada e do funcionamento defensivo (item D). Destaca-se trecho do diário de campo da psicoterapeuta:

"Desde o início da sessao que ela fala sobre esse seu jeito de se deixar ser 'abusada', penso em sua mae, que apanhava do marido, e mais para o fim da sessao, quando ela fala que acaba se submetendo ao que os outros querem dela, mesmo que isso faça mal a ela, lembro da mae dela. Em uma outra sessao, [a paciente] teria me dito que sua mae nunca conseguiu se livrar do marido, e que isso gerava raiva nela. Depois me arrependo de falar, talvez tenha sido muito cedo, pois ela nao faz esta conexao, só lembra do quanto ela odiava que a mae nao conseguia se livrar do marido."

Na supervisao, a psicoterapeuta refere temer ter se antecipado na interpretaçao, mas, na transcriçao das sessoes, verifica-se que, nas associaçoes, aspectos depressivos necessários começam a aparecer, como a falta de vontade de fazer as coisas e uma visao integrada da empregadora, anteriormente vista como má (objeto parcial):

T - [...] E se tu nao conseguir dizer pelo menos alguns 'naos', tu vais te sentir assim como tu te sente, usada, como se ela [empregadora] tivesse abusando da tua boa vontade, como se ela tivesse te maltratando mesmo.

P - É.

T - E eu estou todo tempo me lembrando um pouquinho da história da mae que tu me contou, que pra ti era difícil entender porque tua mae nao largava o marido dela, mesmo apanhando, mesmo passando dificuldades
[...].

P - É, eu acho que, sei lá, é difícil. A gente nao entende, tanto é que eu nao falo assim mais com ela. Sei lá, a minha família é muito assim, na verdade eu nem tenho família porque é cada um por si.
[...]

T - Também tem coisas boas que a [empregadora] faz né...

P - É e o marido dela, assim, ele é meio chato pra roupa, mas ele também, assim, é muito legal. Quando a gente vai jantar pizza, ele corta a pizza pra mim, sabe, ele me serve e tal, daí isso ajuda bastante. E eles sao simples, assim, nessa questao, eu me sinto melhor
[...]. Eu acho que eu virei gente [...]. Eu acho que esse emprego também já me ajudou bastante."

Na sequência, a paciente discorre sobre nao gostar de seu sorriso. A psicoterapeuta pôde realizar algumas interpretaçoes (item C), como o que foi narrado pela psicoterapeuta:

"Fica claro que o sorriso que ela nao gosta é sua infelicidade e falta de vontade de viver, por nao saber o que quer, para onde ir e como fazer para que as coisas aconteçam para ela. Digo isso a ela, e aqui sim acho que ela relaciona, de forma surpreendente, com sua infelicidade e falta de confiança em si mesma."

Observa-se que paciente e psicoterapeuta realizam um encontro emocional, auxiliando a paciente a compreender-se melhor. Pode-se observar microtransformaçoes no transcorrer dessa sessao, as quais nao ocorrem apenas em decorrência de interpretaçoes decodificadas, mas sim com o fato de a emoçao vivida naquele momento poder ser captada. Nao se deve considerar apenas a decodificaçao da comunicaçao, e sim a transformaçao em relaçao à comunicaçao21.

No entanto, no grupo de supervisao, a psicoterapeuta segue narrando o temor contratransferencial de que a psicoterapia seja para a paciente como as roupas, nas quais esta despende grande parte de seu salário e nao consegue utilizar. No final da sessao, a paciente relatou que desejava ser massoterapeuta e ficar rica. No grupo de supervisao, há a impressao de que seria difícil trabalhar os aspectos de inveja com ela, que sao projetivos. Sentem ainda nao haver o vínculo necessário para trabalhar assunto tao delicado.


20ª SESSAO DE PSICOTERAPIA

A 20ª sessao ocorreu em um período do tratamento com presenças (sessoes 19 e 20), intercaladas com diversas ausências (sessoes 16, 17 e 18). Na 19ª sessao (aderida à técnica), Lara compareceu após envio de mensagem telefônica da psicoterapeuta, afirmando que a aguardaria em seu horário. Apresentou-se com o visual modificado (maquiagem descrita como inadequada pela psicoterapeuta, "estava maquiada como uma boneca") e com discurso ilógico, sem espaço para reflexao. A psicoterapeuta achava que a paciente nao viria na 20ª sessao. Nesse dia, a psicoterapeuta recebeu uma ligaçao de um número nao identificado, mas nao conseguiu atendê-la. Fantasiou que era Lara, avisando que nao viria. Na sequência, na 20ª sessao, a paciente chegou atrasada, ansiosa, falando muito rapidamente e com discurso confuso, trocando de assunto sem uma lógica aparente.

"Respira e diz que nao tem muita novidade, desde a semana passada. Lara fala muito rápido, sem pensar, e aí fica confuso. Por muitas vezes na sessao fico só tentando discriminar o que ela está dizendo, para poder pensar um pouco. Era uma coisa em cima da outra" (diário de campo da psicoterapeuta).

Aborda a possibilidade de sua iniciaçao sexual de forma impulsiva e sem prevençao contraceptiva e contra doenças sexualmente transmissíveis. Diante desse cenário, a psicoterapeuta adota postura de orientaçao psicoeducativa, questionando o conhecimento da paciente sobre o assunto e orientando-a a marcar uma consulta ginecológica. O grupo de supervisao e a psicoterapeuta temem que ela engravide, já que Lara repete diversas vezes, no transcorrer do tratamento, que deseja ter um filho menino. Um membro do grupo verbaliza que Lara está "na beira do abismo" (sic) e apoia a conduçao nao aderida à técnica realizada pela psicoterapeuta. O grupo considera a orientaçao da necessidade de prevençao como responsabilidade da psicoterapeuta, porém com cuidado para nao assumir uma postura moralista.

O clima foi considerado pelas juízas com entrosamento emocional entre paciente e psicoterapeuta, mas nao completamente (item E1). A atitude da psicoterapeuta proporcionou poucos momentos reflexivos ao longo da sessao (item E2). O tema da sessao iniciou com o relato sobre o curso de massoterapia que a paciente desejava fazer. No grupo de supervisao havia a orientaçao de a psicoterapeuta auxiliá-la a buscar informaçoes sobre o curso, pois Lara mostrava-se confusa. Destaca-se a sequência de intervençoes da psicoterapeuta, que, intercaladas com as verbalizaçoes imprecisas da paciente, buscavam organizar suas ideias e orientá-la, como, por exemplo:

T - Mas é por ano? [...] Tu fazes o 1º, depois o 2º e o 3º ano? [...] Sao provas que tu deves fazer? E pra fazer massoterapia tens que terminar o ensino médio? [...] E tu já pensaste em ligar pra perguntar? [...] Tu tens que achar tempo, mesmo que tu nao vás lá presencialmente, para estudar... se de manha nao dá, de tarde, de noite...

Na sequência, o assunto abordado pela paciente foi seu novo relacionamento amoroso e a necessidade de iniciar sua vida sexual, o que preocupou a psicoterapeuta. Essa iniciaçao sexual foi compreendida no grupo de supervisao como um mecanismo contrafóbico (irá realizá-lo de forma impulsiva). O namorado foi descrito pela paciente como alguém que cuida dela, e nao alguém de quem ela gosta. Referiu temer a sexualidade, mas necessitar vivenciá-la. Nao relatou preocupaçao com questoes genitais, e sim com sua aparência nua em frente ao rapaz. A paciente relatou, rindo, que suas amigas comentam que ela é antiquada ou que ela deve ter sido abusada para ser tao traumatizada, referindo que irá perguntar para sua mae, pois nao lembra. Demonstrou afeto inadequado, considerando-se que o tema de abusos em sua infância foi narrado por ela em outro momento do tratamento.

A psicoterapeuta registrou sentir que as discriminaçoes que procurava fazer nao eram absorvidas pela paciente. "Fico preocupada, sentindo que está prestes a repetir tudo das irmas, que é o que diz nao querer." O temor toma conta da psicoterapeuta e, também, dos membros do grupo de supervisao. Quanto maior a excitaçao emocional do paciente, menos complexa deve ser a intervençao16. Em supervisao combina-se a necessidade de se adotar uma postura psicoeducativa, oferecendo orientaçoes. Um membro do grupo de supervisao cogitou conseguir uma consulta médico-ginecológica para a paciente, mas o grupo percebeu que há um limite entre o que se pode oferecer. O grupo pontuou que ela necessitava compreender objetivamente porque tinha que ir ao ginecologista, contando com a ajuda da psicoterapeuta em funçao do desamparo. Considerou que pensar em questoes subjetivas, como o medo da sexualidade, deveria ser abordado posteriormente nas sessoes seguintes. Mesmo assim, a psicoterapeuta sentia que ela nao marcaria a consulta e que deveria adotar uma postura de mae de adolescente.

No Iasp, as juízas consideraram que a psicoterapeuta perdeu a neutralidade na maioria de suas intervençoes (item B). Isso pode ser ilustrado no fragmento:

T - Ahm tu vê isso do ginecologista para o dia 24?

P - Vou tentar.

T - Entao tá. Já é uma tarefa.


Diante das urgências identificadas pela psicoterapeuta, portanto, a adesao à técnica psicanalítica nao foi possível nessa sessao. As juízas consideraram que a psicoterapeuta realizou quase que exclusivamente intervençoes do tipo combinaçoes, solicitaçao de tarefas, sugestao e/ou persuasao (item A), que a psicoterapeuta nao realizou nenhuma ou apenas uma interpretaçao dentre as intervençoes realizadas (item C). Além disso, a psicoterapeuta nao utilizou dados da relaçao transferencial-contratransferencial, tampouco avaliou o padrao de relacionamentos fora da sessao. Os dados do passado nao foram conectados com o presente, e nao foi avaliado o funcionamento defensivo (item D).

Na técnica psicoterápica com pacientes borderline, compreende-se que os terapeutas "andam sobre uma corda bamba". Há o questionamento com relaçao à técnica psicoterapêutica e à atitude do psicoterapeuta: até que ponto pode-se tolerar as faltas ao tratamento e o risco elevado de actings violentos que coloquem os pacientes em risco?22 Gabbard e Westen25 sugerem que mais do que pensar se uma técnica é ou nao psicanalítica, os terapeutas deveriam ponderar se é ou nao terapêutica. Se for terapêutica, esta técnica pode, em determinadas circunstâncias, ser empregada para promover mudança. A psicoterapeuta de Lara precisou, no contexto específico dessa sessao, adotar atitude mais diretiva e prescritiva com o objetivo de organizar a paciente e evitar possíveis danos. No entanto, pode-se conjecturar que o afastamento da técnica se deveu por pressao da contratransferência (medo de possíveis actings). A terapeuta parece ter assumido papel de maternagem, valorizando essa atitude em detrimento à necessária reorganizaçao do setting e à restauraçao da aliança terapêutica. Os ataques realizados ao tratamento (ausências) nao foram trabalhados suficientemente, a ponto de modificar o comportamento de Lara. Nesse sentido, é importante lembrar a recomendaçao derivada dos estudos sobre abandono na Terapia Focada na Transferência, que mostram diminuiçao dos índices de abandono na medida em que maior ênfase à manutençao do contrato passou a ser estimulada26.


ANALISE INTEGRATIVA DA 13ª E 20ª SESSOES

Torna-se importante buscar hipóteses explicativas para o motivo das diferenças entre o funcionamento psíquico da paciente e seu impacto no instrumental utilizado pela psicoterapeuta nessas duas sessoes. A análise minuciosa da 20ª sessao indicou que o período de faltas que a antecedeu (sessoes 16, 17 e 18) coincidiu com diversos eventos narrados pela paciente, relacionados aos seus investimentos objetais: faltas às consultas médico-odontológicas (importante tópico de cuidado discorrido no tratamento), nao realizar as visitas semanais à irma (a única referência familiar), início do relacionamento amoroso (descrito como alguém que cuida da paciente) e o fato de que a mae viria morar perto dela (fonte de apreensao, devido ao relacionamento conflituoso entre elas).

Pode-se pensar que houve uma transferência de uma série de investimentos libidinais no objeto namorado, que evocaram na paciente um novo caminho em busca de reconstruir o seu self fragmentado. A presença de afetos intensos e indiscriminados conduzia a paciente a comportamentos impulsivos (actings), incapazes de serem processados e pensados. A intimidade e segurança da relaçao terapêutica vivenciada no período anterior do tratamento (como ilustrado na 13ª sessao) é tao distinta de todas as relaçoes experimentadas em sua trajetória de vida que sua introjeçao pode ser parcial, instável, fragmentada ou, ainda, anulada. Nesse sentido, a nao interpretaçao desse movimento, aliada à atitude prescritiva voltada para os actingsouts (mais do que a atençao aos actings dirigidos ao próprio setting), pode ter contribuído para a interrupçao prematura do tratamento. Desse modo, ainda que a atitude mais ativa da psicoterapeuta tenha sido apoiada pelo grupo de supervisao, entende-se que esse tipo de intervençao pode justamente impedir a comunicaçao do paciente21. Na sequência da 20ª sessao, ocorreram faltas (sessoes 21, 22, 23 e 24) e diversas tentativas de contato por parte da psicoterapeuta, sem sucesso. A aliança foi rompida sem possibilidade de reparaçao naquele momento.

Entretanto, é importante mencionar que alguns meses depois a paciente foi em busca da psicoterapeuta para conversar, finalizar o tratamento e pagar pelos honorários das sessoes pendentes. O modo íntegro como buscou realizar esse desfecho demonstrou uma modificaçao nos padroes repetitivos de relaçao relatados em sua história pregressa. Pagou pelas sessoes de atendimento, demonstrando investimento em si, nao apenas evacuaçao de informaçoes e afetos; pôde ser grata à psicoterapeuta e oferecer o pagamento em reconhecimento disso. Apesar do processo errático e interrompido, parece ter se beneficiado, em algum grau, do encontro terapêutico.


CONSIDERAÇOES FINAIS

Este estudo de caso sistemático examinou de modo naturalístico uma psicoterapia psicanalítica interrompida precocemente com uma paciente borderline, examinando, em profundidade, as sessoes em que se constatou maior e menor adesao à técnica psicanalítica. O estudo foi exploratório e articulou método clínico (supervisao do caso) e métodos empíricos, qualitativos (análise de conteúdo) e quantitativos (adesao à técnica avaliada pelo Iasp) na compreensao de um processo de psicoterapia. Os resultados indicaram que o tratamento foi psicanalítico em termos das intervençoes terapêuticas empregadas na maioria das sessoes, ainda que algumas sessoes tenham sido classificadas como nao psicanalíticas.

Com base nas análises realizadas, fica evidente que a técnica empregada pela terapeuta deriva nao só do treinamento psicoterápico clássico, mas também do funcionamento da paciente na sessao. Na 13ª sessao, em que a paciente exibia funcionamento mais integrado, a técnica foi mais aderida ao modelo psicanalítico; na 20ª sessao, em que a paciente estava desorganizada, regressiva e confusa, a terapeuta assumiu postura nao psicanalítica. A análise, realizada em profundidade, do microprocesso de duas sessoes (mais e menos aderidas à técnica psicanalítica) sugere que a fragilidade da aliança, aliada à nao interpretaçao das resistências e de esforços ativos para proteger o contrato terapêutico, pode ter contribuído para o abandono. Para melhor examinar a pertinência dessa hipótese seria necessário o estudo do processo global. Todavia, os presentes achados, tomados em conjunto com a literatura, apontam para a necessidade de o psicoterapeuta estar atento, ao mesmo tempo, para dois vértices: o funcionamento do paciente borderline (que pode requerer atitudes mais ativas e intervençoes de apoio, quando mais regressivo) e a manutençao do setting, do contrato e da aliança terapêutica (que pode requerer combinaçoes explícitas, confrontaçoes e interpretaçoes transferenciais e de defesa).

Os resultados do estudo nao permitem generalizaçao para outros casos. A análise qualitativa de apenas duas sessoes pode levar a falsos pressupostos sobre o processo como um todo e nao refletir a complexidade de todo o tratamento. Outra limitaçao que merece ser mencionada é a ausência de medidas de progresso e resultado do tratamento. Estas nao foram possíveis por nao se adequarem aos procedimentos usuais na instituiçao em que ocorrera o atendimento em estudo. Tal fato reflete a ainda frágil integraçao entre pesquisa e prática clínica no contexto onde o estudo foi conduzido. Nao obstante, a triangulaçao de fontes de dados (gravaçao das sessoes, diário de campo da psicoterapeuta, relatos e gravaçao da supervisao) bem como de métodos de avaliaçao (qualitativo e quantitativo) aumenta a validade interna do estudo. Salienta-se que o estudo foi exploratório e deve ser ampliado, a partir do exame mais completo de todas as sessoes deste caso, bem como por meio da comparaçao com outros casos semelhantes ou contrastantes em termos de diagnóstico e desfecho. A avaliaçao da prática psicanalítica usual com pacientes borderline e sua comparaçao com os modelos de intervençao baseados em evidências é outra linha de estudos promissora para ampliar o conhecimento sobre como funciona a psicoterapia psicanalítica com pacientes borderline.


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1. Doutora em Psicologia Clínica pela PUCRS. Professora da Faculdade de Psicologia da Unisinos. Psicóloga. Porto Alegre, RS, Brasil
2. Doutora em Ciências Médicas - Psiquiatria pela UFRGS. Professora do Programa de Pós-Graduaçao da Faculdade de Psicologia da Unisinos
3. Doutora em Psicologia pela UFRGS. Pós-doutorado em Psicologia pela UFRGS. Professora do Programa de Pós-Graduaçao da Faculdade de Psicologia da PUCRS

Correspondência
Luísa Fernanda Habigzang
PUCRS - Av. Ipiranga, 6681, Prédio 11, 9º andar
90619-900 Porto Alegre, RS, Brasil
luisa.habigzang@pucrs.br

Submetido em: 14/10/2015
Aceito em: 21/03/2016

Instituiçao: PUCRS

 

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