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Revista Brasileira de Psicoteratia

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Rev. bras. psicoter. 2015; 17(3):47-62



Artigos Originais

O desenvolvimento da regra fundamental na obra de Freud: da hipnose à associaçao livre*

The development of the fundamental rule in Freud's work: from hypnosis to free association*

Luciano Isolan

Resumo

Uma das principais ferramentas da técnica psicanalítica é a associaçao livre, intitulada pelo próprio Freud como a regra fundamental da psicanálise. Essa regra pode ser conceituada como o compromisso assumido pelo paciente de comunicar ao analista tudo o que lhe vier à mente, independentemente de suas inibiçoes ou do fato de achá-las insignificantes ou nao. Freud desenvolveu a técnica da associaçao livre gradualmente a partir da hipnose e do método catártico. O conhecimento desses métodos anteriores à associaçao livre torna possível uma maior compreensao a respeito do desenvolvimento da regra fundamental. Esse aprimoramento na técnica psicanalítica possibilitou o acesso do material recalcado para a consciência e revelou ao paciente a natureza de seu inconsciente. O presente trabalho se propoe a realizar um estudo da evoluçao da regra fundamental na obra de Freud através de seus sucessivos períodos, passando da hipnose à associaçao livre.

Descritores: Associaçao livre; Psicanálise; Psicoterapia.

Abstract

One of the main tools of psychoanalytic technique is free association, headed by Freud himself, as the fundamental rule of psychoanalysis. This rule can be defined as the commitment of the patient to communicate to the analyst whatever comes to mind, regardless of their inhibitions or fact find them insignificant or not. Freud developed the technique of free association gradually from the hypnosis and the cathartic method. Knowledge of these previous methods to free association makes possible a greater understanding about the development of the fundamental rule. This enhancement in psychoanalytic technique allows access of the repressed material for awareness and revealed to the patient the nature of his unconscious. This paper aims to conduct a study of the evolution of the fundamental rule in Freud's work through its successive periods through hypnosis to free association.

Keywords: Free association; Psychoanalysis; Psychotherapy.

 

 

INTRODUÇAO

Uma das principais ferramentas da técnica psicanalítica é a associaçao livre, que é uma das vias de acesso ao inconsciente. A importância da associaçao livre para o método psicanalítico foi tao grande que o próprio Freud a intitulou como a regra fundamental da psicanálise. Essa regra pode ser conceituada como o compromisso assumido pelo paciente de comunicar ao analista tudo o que lhe vier à mente, independentemente de suas inibiçoes ou do fato de achá-las insignificantes ou nao.

Freud desenvolveu a associaçao livre com seus pacientes de uma forma gradual, possivelmente entre 1892 e 1898, e como resultado de experimentaçao de diversos outros métodos pré-psicanalíticos, como a hipnose, a sugestao e o método catártico. O conhecimento desses métodos anteriores à associaçao livre torna possível uma maior compreensao a respeito do desenvolvimento da regra fundamental.

O presente trabalho se propoe a realizar um estudo teórico da evoluçao da regra fundamental na obra de Freud através de seus sucessivos períodos, passando da hipnose à associaçao livre.


OS PRIMORDIOS DA ASSOCIAÇAO LIVRE

Freud se formou em medicina em 1881. Ainda estudante, em 1876, começou a trabalhar no laboratório de fisiologia de Ernst Brucke, sob cuja direçao efetuou pesquisas na área de fisiologia e histologia do sistema nervoso. Foi nesse instituto, onde permaneceu seis anos, que teve o primeiro contato com o renomado médico vienense Joseph Breuer. Depois de formado, em 1883, ingressou no serviço de psiquiatria de Theodor Meynert, onde trabalhou como clínico e aplicou-se nos estudos de neuroanatomia. Antes de se dedicar inteiramente ao estudo psicanalítico, publicou vários trabalhos sobre afecçoes orgânicas, tais como as afasias e as encefalopatias infantis. De outubro de 1885 a fevereiro de 1886, viajou à França, onde trabalhou na Salpêtrière, em Paris, sob a direçao do eminente neurologista Charcot. Durante seus estudos em Paris, Freud observou e vivenciou o emprego da hipnose por Charcot, que fazia aparecer e desaparecer quadros histéricos nos pacientes. Ao utilizar a hipnose, Charcot chamou a atençao da comunidade médica, que nunca havia reconhecido o hipnotismo como método científico. Após retornar a Viena, Freud logo se desapontou com os métodos tradicionalmente existentes na época no tratamento da histeria, tais como hidroterapia, eletroterapia, massagens, dentre outros, adotando gradualmente a prática da hipnose e da sugestao. Freud se posicionou radicalmente contra as resistências que o meio médico, principalmente na Alemanha e na Austria, tinha contra o hipnotismo e apoiou a utilidade desse método no tratamento das patologias nervosas, particularmente da histeria. O seu interesse pela hipnose o fez traduzir um livro de Bernheim sobre a sugestao hipnótica e suas aplicaçoes terapêuticas em 1889 e outro em 1892. Freud também fez uma visita de algumas semanas às clínicas de Liébeault e Bernheim em Nancy, na França, no verao de 1889, para aprimorar sua técnica em hipnose.

Em Viena, Freud começou a colaborar com Joseph Breuer, clínico renomado que, alguns anos antes, entre 1880 e 1882, havia tratado uma paciente que apresentava uma série de sintomas histéricos, como tosse nervosa, distúrbios da visao, paralisias motoras, alucinaçoes, distúrbios da linguagem, dentre outros, enquanto cuidava do pai enfermo. Trata-se do clássico caso da Srta. Anna O., que pode ser considerado o primeiro caso em que a técnica catártica foi utilizada. Breuer observou com essa paciente que os sintomas histéricos desapareciam sempre que o acontecimento traumático ligado a eles era reproduzido sob hipnose. Porém, a intensa transferência erótica, que se manifestou ao final do tratamento como uma pseudociese, fez que com Breuer interrompesse o caso prematuramente.

Em um artigo intitulado "Histeria", Freud1 define as principais características do método vigente na época no tratamento dessa patologia. Nesse artigo, Freud recomenda dois tipos de tratamento para a neurose histérica. O primeiro consistiria no afastamento do paciente de seu ambiente familiar e sua internaçao em um hospital. Tais medidas teriam a funçao de afastar o paciente de seu ambiente familiar, considerado por ele como gerador de crises, e de criar condiçoes ideais de observaçao e controle das crises. O segundo tipo de tratamento consistiria na remoçao das causas psíquicas dos sintomas histéricos. Diz Freud1 sobre esse tratamento:

O tratamento direto consiste na remoçao das fontes psíquicas que estimulam os sintomas histéricos, e isto se torna compreensível se buscarmos as causas da histeria na vida ideativa inconsciente. Consiste em dar ao paciente sob hipnose uma sugestao que contém a eliminaçao do distúrbio em causa. [...] O efeito se torna maior se adotarmos um método posto em prática, pela primeira vez, por Joseph Breuer em Viena, e fizermos o paciente, sob hipnose, remontar à préhistória psíquica de sua doença, compelindo-o a reconhecer a ocasiao psíquica em que se originou o referido distúrbio (p. 93).
Como Charcot, Breuer também utilizava a hipnose no tratamento de pacientes histéricos. Porém, enquanto Charcot procurava influenciar seus pacientes através de sugestao direta, Breuer preferiu deixá-los descrever seus próprios sintomas e torná-los capazes de encontrar alívio, reencenando, tanto quanto possível, a situaçao traumática original. O método de Breuer, chamado de catártico, era fundamentalmente baseado na hipótese de que os sintomas dos pacientes histéricos eram situaçoes passadas que tiveram grande repercussao, mas que foram esquecidas. Tais sintomas representavam um emprego anormal de doses de excitaçao que nao haviam sido suficientemente descarregadas. A terapêutica catártica consistia entao em induzir o paciente através da hipnose a relembrar os traumas esquecidos e reagir a eles com expressoes de afeto. Quando isso ocorria, o sintoma, que até entao tomara o lugar dessas expressoes de emoçao, desaparecia. Freud2 já dizia em "Uma breve descriçao da psicanálise" que: "Dessa maneira, um só e mesmo procedimento servia simultaneamente aos propósitos de investigar o mal e livrar-se dele, e essa conjunçao fora do comum foi posteriormente conservada pela psicanálise" (p. 220). Como observa Garcia-Rosa3, Freud acrescentou um elemento à técnica criada por Breuer. Enquanto este permanecia passivo diante da torrente de fatos narrados pela sua paciente, nao procurando influenciá-la em nada, Freud passou a empregar a sugestao diretamente como meio terapêutico. Dessa forma, a hipnose era empregada para se chegar aos fatos traumáticos, como fazia Breuer, mas, uma vez esses fatos tendo sido identificados, Freud fazia uso da sugestao para eliminá-los ou pelo menos debilitá-los em sua força patogênica.

Freud logo se deu conta das limitaçoes e dificuldades do método hipnótico, pois percebeu que nem todos os pacientes eram hipnotizáveis e que os sintomas eliminados com essa técnica frequentemente reapareciam. Em "Estudos sobre a histeria"4, observamos, através dos casos clínicos pormenorizadamente relatados, um progresso dos procedimentos técnicos que Freud adotou desde a sugestao através da hipnose até o desenvolvimento da associaçao livre. Do mesmo modo que se situa a descoberta do método catártico na cura de Anna O. por Breuer, situa-se no tratamento da Srta. Emmy von N. por Freud o abandono da hipnose e o surgimento da associaçao livre.

A paciente Emmy von N., uma rica viúva diagnosticada como histérica por Freud, tinha ao redor de 40 anos e apresentava um quadro de múltiplas dores, alucinaçoes, tiques, tartamudez, insônia e fobias a certos animais. Nesse caso, que durou cerca de sete semanas, Freud empregou diversas modalidades de tratamento. Além do método catártico, utilizado aqui por ele pela primeira vez, fez uso da sugestao hipnótica e do que ele denominava a "técnica da pressao". Nessa técnica Freud pressionava a fronte do paciente com a mao, na esperança de que o paciente pudesse relembrar acontecimentos de sua vida passada que trouxessem alguma compreensao quanto às origens de sua doença. Durante esse tratamento há uma interessante passagem que talvez seja o primeiro aparecimento que alude ao que depois se tornaria a técnica da associaçao livre. Diz Freud4 que:
Todas às vezes, portanto, mesmo enquanto a massageio, minha influência já começa a afetá-la; a paciente fica mais tranquila e mais lúcida, e mesmo sem que haja perguntas sob hipnose consegue descobrir a causa de seu mau humor naquele dia. Tampouco sua conversa durante a massagem é sem objetivo como poderia parecer. Pelo contrário, encerra uma reproduçao razoavelmente completa das lembranças e das novas impressoes que a afetaram desde a última conversa, e, muitas vezes, de maneira bem inesperada, progride até as reminiscências patogênicas, que ela vai desabafando sem ser solicitada. É como se tivesse adotado meu método e se valesse de nossa conversa, aparentemente sem constrangimento e guiada pelo acaso, como um complemento de sua hipnose. Por exemplo, hoje começou a falar de sua família e, com muitos rodeios, passou ao assunto de um primo. [...] Ela acompanhou a história com expressoes de horror e ficou repetindo sua fórmula protetora ("Fique quieto! - Nao diga nada! - Nao me toque!") (p. 90-91).
Em outro momento posterior do tratamento, a mesma paciente, claramente irritada com as interrupçoes e com as interrogaçoes insistentes de Freud sobre a origem de seus sintomas, diz: "[...] em um tom claro de queixa, que eu nao devia continuar a perguntar-lhe de onde provinha isto ou aquilo, mas que a deixasse contar-me o que tinha a dizer. Concordei com isso e ela prosseguiu, sem nenhum preâmbulo" (p. 97). Freud reconhecia que, por mais tediosas e repetitivas que fossem as narrativas, ele nao ganhava nada com suas interrupçoes, mas que tinha que ouvir as histórias da paciente até o fim, com todos os seus minuciosos detalhes.

Apesar de o método catártico poder ser considerado como um precursor da psicanálise, ele foi apenas um aprimoramento da hipnose, procedimento utilizado na época para o tratamento das doenças nervosas. Foi Freud quem introduziu as inovaçoes técnicas que transformariam o método catártico na psicanálise. Ao desistir da hipnose e desenvolver a técnica da associaçao livre, Freud estava criando o que seria considerada "a regra fundamental" da psicanálise.


A ASSOCIAÇAO LIVRE NA OBRA DE FREUD

Freud destacou a importância da associaçao livre em vários de seus textos e atribuiu a essa técnica um valor fundamental dentro da psicanálise. Cabe salientar que, em "Uma nota sobre a técnica da préhistória da técnica de análise"5, há a mençao de um breve ensaio de 1823 intitulado "A arte de tornar-se escritor em três dias", de autoria de Ludwig Borne, que Freud ganhou de presente aos 14 anos e que termina com o seguinte trecho:
Pegue algumas folhas de papel e por três dias a fio anote, sem falsidade ou hipocrisia, tudo o que lhe vier à cabeça. Escreva o que pensa de si mesmo, de sua mulher, da Guerra Turca, de Goethe, do julgamento de Fonk, do Juízo Final, de seus superiores, e, quando os três dias houverem passado, ficará espantadíssimo pelos novos e inauditos pensamentos que teve. Esta é a arte de tornar-se um escritor original em três dias (p. 273).
Nessa citaçao fica evidente a intençao do autor de romper com a censura consciente e com a lógica formal do pensamento. É tentador supor que Freud, ao ler esse ensaio, deva ter sido influenciado por tais pressupostos, os quais podem ter contribuído para o emprego psicanalítico da associaçao livre.

Em "A interpretaçao dos sonhos", Freud6 reconhece que, embora muitos sonhos desafiassem a compreensao simples e fossem desprovidos de sentido lógico, isso nao significava que nao tinham lógica própria. Para Freud, os sonhos continham um raciocínio conectivo intrínseco dentro de si. Reconhecendo uma lógica temporal e detalhes com precisao, ele observou que nos sonhos:
Sempre que nos mostram dois elementos muito próximos, isso garante que existe alguma ligaçao especialmente estreita entre o que corresponde a eles nos pensamentos do sonho. Da mesma forma, em nosso sistema de escrita, "ab", significa que as duas letras devem ser pronunciadas numa única sílaba. Quando se deixa uma lacuna entre o "a" e o "b" isso significa que o "a" é a última letra de uma palavra e o "b", a primeira da seguinte. Do mesmo modo, as colocaçoes nos sonhos nao consistem em partes fortuitas e desconexas do material onírico, mas em partes que sao mais ou menos estreitamente ligadas também nos pensamentos do sonho (p. 340).
Segundo Bollas7, a partir de sua observaçao de que os sonhos fluem segundo certa lógica temporal, foi possível a Freud descobrir as leis da associaçao livre. O discurso do paciente deveria ser um discurso livre de sentido linear consciente, ou seja, o indivíduo deveria desfrutar de uma liberaçao do conhecimento lógico. Entao, Freud concluiu que, assim como nos sonhos, a ordem em que o paciente diz o que está em sua mente pode revelar sua própria lógica intrínseca. As associaçoes dessa lógica peculiar seriam responsáveis por revelar os desejos, as ansiedades, a memória e os conflitos psíquicos do paciente.

Freud já utilizava o processo de associaçao livre na sua autoanálise e particularmente na análise dos sonhos. Nesse caso, é um elemento do sonho que serve de ponto de partida para a descoberta das cadeias associativas que levam aos pensamentos do sonho. Entao, em "A interpretaçao dos sonhos"6 já é possível identificar o que poderia ser considerado algumas das ideias precursoras relacionadas à associaçao livre. Diz Freud que:
Meus pacientes assumiam o compromisso de me comunicar todas as ideias ou pensamentos que lhe ocorressem em relaçao a um assunto específico [...]. É necessário insistir explicitamente para que renuncie a qualquer crítica aos pensamentos que perceber. Dizemos-lhe, portanto, que o êxito da psicanálise depende de ele notar e relatar o que quer que lhe venha à cabeça, e de nao cair no erro, por exemplo, de suprimir uma ideia por parecer-lhe destituída de sentido (p. 135-136).
Cabe observar que, quando Freud solicitava ao paciente que associasse sobre o seu sonho, ele nao estava pedindo ao sonhador ideias sobre o seu sonho. Ele nao estava se voltando à consciência sua ou à do analisando para ver como poderiam entender o sonho. Ao contrário, Freud preconizava que a pessoa deveria apenas relatar o que estivesse pensando naquele momento, independentemente do quanto lhe parecessem insignificantes esses pensamentos.

Nesse mesmo trabalho, Freud6 destaca as diferenças entre uma atitude reflexiva de uma atitude observadora quanto aos próprios processos psíquicos. Para ele, na atitude reflexiva haveria paralelamente uma atitude crítica que levaria à rejeiçao de algumas das ideias que ocorreriam após ser percebidas. Além disso, poderia haver a interrupçao de outras ideias abruptamente, sem o seguimento dos fluxos de pensamento que elas lhe desvendariam, e essa atitude crítica também poderia fazer com que outras ideias nunca pudessem se tornar conscientes. Já na atitude auto-observadora, seria necessário nada mais do que apenas a supressao dessa atitude crítica. Caso se tenha êxito nessa tarefa, nem sempre fácil, iriam vir à consciência inúmeras ideias que, de outro modo, jamais conseguiriam ser captadas.

Em "O método psicanalítico em Freud" sao evocadas as principais transformaçoes pelas quais seu método passou. Freud8 inicia relatando os trabalhos iniciais com Breuer e esclarece os inconvenientes da hipnose, a qual seria censurável por ocultar as resistências e por fornecer apenas informaçoes parciais levando a sucessos provisórios. Além disso, uma proporçao considerável de pacientes nao seria hipnotizável, o que também restringiria em muito a prática da hipnose. Nesse trabalho, Freud8 afirma ter encontrado "[...] um substituto da hipnose, plenamente satisfatório, nas associaçoes do paciente, ou seja, nos pensamentos involuntários - quase sempre sentidos como perturbadores e por isso comumente postos de lado - que costumam cruzar a trama da exposiçao intencional" (p. 237).

A associaçao livre permitiria entao atingir com maior facilidade os elementos responsáveis pela liberaçao dos afetos, das lembranças e das representaçoes. O único vestígio remanescente da hipnose era a solicitaçao de que o paciente se deitasse no diva. Freud8 descreve entao da seguinte forma essa técnica:
[...] exorta os pacientes a se deixarem levar em suas comunicaçoes, "mais ou menos com se faz em uma conversa a esmo, passando de um assunto a outro". Antes de exortá-los a um relato pormenorizado de sua história clínica, ele os instiga a dizerem tudo o que lhes passar pela cabeça, mesmo o que julgarem sem importância, ou irrelevante, ou disparatado. Ao contrário, pede com especial insistência que nao excluam de suas comunicaçoes nenhum pensamento ou ideia pelo fato de serem embaraçosos ou penosos (p. 237).
Nesse texto, Freud8 diz que no relato da história clínica irao surgir lacunas na memória do paciente, que seriam como amnésias resultantes de um processo de recalcamento e cuja motivaçao é associada a um desprazer. Esclarece que as forças psíquicas que deram origem a esse recalcamento estariam na resistência que se opoe à restauraçao das lembranças. Segundo Freud, "o valor das ideias inintencionais para a técnica terapêutica reside nessa relaçao delas com o material psíquico recalcado" (Ibid., p. 238). Avançar através das associaçoes livres até o material recalcado era o que permitiria tornar acessível à consciência o que até entao era inconsciente. Com base nessa elaboraçao teórica, formulada através de sua experiência clínica, foi possível desenvolver "a arte da interpretaçao à qual compete a tarefa, por assim dizer, de extrair do minério bruto das associaçoes inintencionais o metal puro dos pensamentos recalcados" (p. 238).

Em "Fragmento da análise de um caso de histeria", Freud9 comenta no prefácio que a "técnica psicanalítica sofreu uma revoluçao radical" (p. 23) em relaçao à técnica exposta no tratamento dos primeiros casos de histeria. Assim, ao invés de focalizar e submeter à analise os sintomas com o intuito de esclarecê-los um após o outro, Freud9 diz que agora deixa que o paciente "determine o tema do trabalho cotidiano, e assim parto da superfície que seu inconsciente ofereça a sua atençao naquele momento [...] a nova técnica é muito superior à antiga, e é incontestavelmente a única possível". Pode-se inferir, já na introduçao do caso Dora, que a regra fundamental passa a ocupar uma posiçao central na técnica analítica freudiana. Cabe ressaltar também a interessante e inspiradora afirmaçao de Freud9 quando diz que: "Quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir, fica convencido de que os mortais nao conseguem guardar nenhum segredo. Aqueles cujos lábios calam denunciam-se com as pontas dos dedos: a denúncia lhes sai por todos os poros" (p. 78-79). Nesse trecho, observa-se que Freud nao estava enfatizando apenas a comunicaçao verbal do paciente, mas também a linguagem nao verbal, que poderia ser expressa através de silêncios, entonaçoes de voz e gestos.

Em "Cinco liçoes de psicanálise", Freud10, comentando sobre a técnica psicanalítica e ressaltando os trabalhos de Jung e do grupo de Zurique com a associaçao de palavras, observa que uma recordaçao em conexao com um número suficiente de "associaçoes livres" permitirá que se desvende o que Freud chamava de um "complexo reprimido". Para tanto, recomenda-se ao paciente falar sobre o que quiser, porém sabe-se que frequentemente se ouvirá como resposta que o paciente nao tem nada a dizer ou que nada lhe surge à mente. Cabe salientar que o método de associaçao utilizado por Jung em Zurique baseava-se em testes de associaçao verbal que procuravam demonstrar experimentalmente a presença do material reprimido. Já a associaçao livre preconizada por Freud deixava ao paciente a responsabilidade e iniciativa das associaçoes. Para Freud as associaçoes livres nunca deixariam de aparecer. Diz Freud10 que: "É que o doente, influenciado pela resistência disfarçada em juízos críticos sobre o valor da ideia, retém-na ou de novo a afasta" (p. 45). Segundo Freud10: "Esse material associativo que o doente rejeita como insignificante, quando em vez de estar sob a influência do médico está sob a da resistência, representa para o psicanalista o minério de onde com o simples artifício da interpretaçao há de extrair o metal precioso" (p. 46).

A expressao "regra fundamental" foi utilizada pela primeira vez no artigo técnico "A dinâmica da transferência", quando Freud11 discutia a questao da resistência transferencial. Nesse artigo, Freud11 descreve que: "[...] assim que entra sob o domínio de qualquer resistência transferencial considerável [...] se sente entao em liberdade de desprezar a regra fundamental da psicanálise, que estabelece que tudo que lhe venha à cabeça deve ser comunicado sem crítica [...]" (p. 119). O termo "fundamental", como destaca Zimerman12, era apropriado, visto que nao seria possível conceber uma análise sem que o paciente disponibilizasse um contínuo aporte de verbalizaçoes que permitissem ao analista proceder a um levantamento, de natureza arqueológica, das repressoes acumuladas no inconsciente, de acordo com o paradigma vigente na época. Nesse mesmo artigo, Freud11 diz que: "[...] se as associaçoes de um paciente faltam, a interrupçao pode invariavelmente ser removida pela garantia de que ele está dominado, momentaneamente, por uma associaçao relacionada com o próprio médico ou com algo a este vinculado"
(p. 112-113). Para Freud, assim que essa explicaçao fosse fornecida, a interrupçao das associaçoes seria removida e o paciente retomaria o fluxo de comunicaçoes ou a situaçao iria se alterar para nao mais uma cessaçao real das associaçoes, mas sim uma retençao das associaçoes devido a sentimentos comuns de desprazer.

Retomando as ideias sobre a atitude reflexiva e a atitude observadora que relatou em "A interpretaçao dos sonhos", em "Recomendaçoes aos médicos que exercem a psicanálise" Freud13 diz que: "[...] atividades mentais, tais como refletir sobre algo ou concentrar a atençao nao solucionam nenhum dos enigmas da neurose: isto só pode ser efetuado ao se obedecer pacientemente à regra psicanalítica, que impoe a exclusao de toda crítica do inconsciente ou de seus derivados" (p. 132). Nesse mesmo trabalho, Freud conceituou a atençao flutuante do analista como a contrapartida à associaçao livre do paciente. Para Freud13, a regra para o médico pode ser assim definida: "Consiste simplesmente em nao dirigir o reparo para algo específico e em manter a mesma 'atençao uniformemente suspensa' em face de tudo o que se escuta" (p. 125). Assim, postula-se que o analista deve conter tanto quanto possível todas as influências conscientes da sua capacidade de prestar atençao e abandonar-se inteiramente à memória inconsciente. Sendo assim, o analista é convidado a buscar ativamente uma determinada atitude mental que é diferente do pensamento lógico, livre de censuras e expectativas, para poder observar entao seu paciente desde uma nova perspectiva. Ainda nesse texto, Freud13 também diz que: "o analista deve voltar seu próprio inconsciente, como órgao receptor na direçao do inconsciente transmissor do paciente [...] o inconsciente do médico é capaz, a partir dos derivados do inconsciente que lhe sao comunicados, de reconstruir esse inconsciente, que determinou as associaçoes livres do paciente" (p. 129). Conforme destaca Mondrzak14, nessa passagem fica claro que o instrumento de observaçao do analista está relacionado ao que permite a captaçao do que é inconsciente e só pode partir da possibilidade de o analista ter acesso a seus próprios processos inconscientes.

Em "Sobre o início do tratamento", Freud15 elabora algumas regras, que prefere chamar de recomendaçoes, para o início do tratamento psicanalítico. Chama a atençao, no entanto, para a diversidade de situaçoes e fatores que se opoem a qualquer mecanizaçao da técnica. Nesse trabalho, Freud15 relata que o material inicial trazido pelo paciente é indiferente, mas em todos os casos deve-se permitir ao paciente ser livre para escolher por onde ele deverá começar a falar. Freud15 diz ao paciente que: "Antes que eu possa lhe dizer algo, tenho de saber muita coisa sobre você; por obséquio, conte-me o que sabe a respeito de si próprio" (p. 149). Porém, Freud ressalta que a única exceçao a esse comentário é que a regra fundamental deve ser comunicada no começo do tratamento, tendo em vista que, sob o efeito da resistência, todo paciente em algum momento do tratamento iria desprezar essa regra. Nessa que talvez seja uma de suas exposiçoes mais completas sobre a associaçao livre, Freud15 diz:
Uma coisa a mais, antes que você comece. O que vai me dizer deve diferir, sob determinado aspecto, de uma conversa comum. Em geral, você procura, corretamente, manter um fio de ligaçao ao longo de suas observaçoes e excluí quaisquer ideias intrusivas que lhe possam ocorrer, bem como quaisquer temas laterais, de maneira a nao divagar longe demais do assunto. Neste caso, porém, deve proceder de modo diferente. Observará que, à medida que conta coisas, irao lhe ocorrer diversos pensamentos que gostaria de pôr de lado, por causa de certas críticas ou objeçoes. Ficará tentado a dizer a si mesmo que isto ou aquilo é irrelevante aqui, ou inteiramente sem importância, ou absurdo, de maneira que nao há necessidades de dizê-lo. Você nunca deve ceder a estas críticas, mas dizê-lo apesar delas [...]. Assim diga tudo o que lhe passa pela mente (p. 149-150).
Ainda nesse mesmo trabalho, descrevendo a técnica da associaçao livre, Freud15 utiliza a famosa metáfora da viagem de trem ao dizer: "Aja como se, por exemplo, você fosse um viajante sentado à janela de um vagao ferroviário, a descrever para alguém que se encontra dentro as vistas cambiantes que se vê lá fora" (p. 150). Essa metáfora assinala o que se quer dizer com livre, ou seja, nao excluir nada voluntária e conscientemente da comunicaçao. Observa-se também o intuito de Freud de deixar o paciente o mais à vontade possível criando uma situaçao propícia para a emergência do material inconsciente.

Em "Um estudo autobiográfico", Freud16 retornou à evoluçao de seu método e insistiu na necessidade do respeito à regra fundamental da psicanálise e como ele costumava rotineiramente proceder com seus pacientes nesse quesito técnico. Diz Freud16 que: "Em vez de incitar o paciente a dizer algo sobre algum assunto, pedi-lhe entao que [...] dissesse o que lhe viesse à cabeça, enquanto deixasse de dar qualquer orientaçao consciente a seus pensamentos" (p. 45). Nesse mesmo texto, Freud16 deixa claro que a associaçao livre é a técnica com a qual se pode tornar consciente o material reprimido que está retido pelas resistências. O autor ressalta também que a associaçao livre nao seria realmente livre. Embora o paciente nao esteja dirigindo suas atividades mentais para um determinado assunto, ele está permanentemente sob a influência da situaçao analítica e da transferência, e tudo que lhe ocorre tem alguma referência com essas situaçoes.

Ao longo de seus trabalhos, observa-se que Freud enfatizou as diversas relaçoes entre a associaçao livre e as diferentes formas de resistência. Para Freud, durante o processo analítico, sob o efeito das resistências, inevitavelmente haveria um momento no qual o paciente desprezaria a regra fundamental e diria que nada lhe ocorre, solicitando ao médico que diga algo. Penso, entretanto, que apesar de haver uma diversidade de formas de comunicar ou nao a regra fundamental no início do tratamento, isso por si só nao seria suficiente para eliminar as resistências conscientes e, principalmente, as inconscientes do paciente.

Em "Resistência e repressao", Freud17 relata que a primeira coisa que se consegue ao estabelecer a regra fundamental é que ela se transforma no alvo dos ataques da resistência. Nesse mesmo artigo, Freud17 enfatiza que seja feita uma "advertência expressa", insistindo para que o paciente siga apenas a superfície de sua consciência, abandonando toda a crítica sobre aquilo que encontra. Prossegue dizendo que: "o sucesso do tratamento, e, sobretudo sua duraçao, depende da conscienciosidade com que ele obedece a esta regra fundamental da análise (p. 294). Segundo Freud17: "O paciente procura, por todos os meios, livrar-se das exigências dessa regra. Em um momento, declara que nao lhe ocorre nenhuma ideia; no momento seguinte, que tantos pensamentos se acumulam dentro de si, que nao pode apreender nenhum" (p. 295). Em seguida, reconhecendo as resistências à regra fundamental, comenta que o paciente poderia entao se utilizar de diversos subterfúgios, tais como vergonha em falar sobre determinado assunto, dizer que o que lhe passou na mente era sem importância ou o que ele pensou se refere a outra pessoa e nao haveria motivo para falar. Freud, de uma forma categórica, diz apenas que se poderia replicar ao paciente que "dizer tudo" significa realmente "dizer tudo".

Para Freud17, os neuróticos obsessivos, através de sua superconscienciosidade e de suas dúvidas, poderiam tornar a regra fundamental quase que inútil. Na tentativa de explorar mais profundamente os motivos que interferem na livre associaçao, em "Inibiçoes, sintoma e ansiedade", Freud18 discorreu sobre as dificuldades específicas do neurótico obsessivo em seguir à regra fundamental. Diz Freud18 que essas dificuldades decorrem em funçao de que: "Seu ego é mais atento e faz isolamentos mais acentuados, provavelmente por causa do alto grau de tensao devido ao conflito que existe entre seu superego e seu id" (p. 123). Freud se referia aqui à tendência do ego do neurótico obsessivo de estar constantemente lutando contra a intrusao de fantasias inconscientes e da manifestaçao de tendências ambivalentes. O ego deveria estar sempre empenhado em impedir associaçoes e ligaçoes de pensamento. Relata Freud18 que tal postura do ego "[...] estaria de acordo com uma das ordens mais antigas e fundamentais da neurose obsessiva que seria o tabu de tocar [...] o toque e o contato físico sao a finalidade imediata de catexias objetais agressivas e amorosas [...] isolar é remover a possibilidade de contato" (p. 124). Conclui Freud18 que: "e quando um neurótico isola uma impressao ou uma atividade interpolando um intervalo, ele está deixando que se compreenda simbolicamente que ele nao permitirá que seus pensamentos sobre aquela impressao ou atividade entrem em contato associativo com outros pensamentos (p. 124). Nesse interessante trecho, observamos que para Freud o associar livremente poderia ser compreendido também como uma forma de ligaçao afetiva/emocional interna.


CONSIDERAÇOES FINAIS

Como foi exposto no presente artigo, a técnica da associaçao livre desenvolveu-se gradualmente a partir da hipnose e do método catártico de Breuer. Essa transiçao ocorreu à luz das experiências que Freud teve com sua autoanálise e as que teve na clínica com os seus primeiros pacientes. Cabe ressaltar que, escutando e acompanhando seus pacientes e tendo a liberdade para questionar e reformular seus próprios métodos, Freud desenvolveu a técnica da associaçao livre. Acatando o pedido de uma paciente que lhe pediu para que ele a deixasse falar livremente, Freud criou uma nova forma de acesso ao inconsciente, a qual utilizamos até hoje ao deixarmos nossos pacientes falarem livremente o que lhes vem à mente.

Esse aprimoramento na técnica psicanalítica possibilitou o acesso do material recalcado para a consciência e revelou ao paciente a natureza de seu inconsciente. Penso que o método catártico de Breuer foi um estágio preliminar da psicanálise, e a mesma teve realmente o seu início após o abandono do método hipnótico e catártico e a introduçao da técnica da associaçao livre por Freud.

Ao longo dos seus trabalhos sobre técnica psicanalítica, Freud estabeleceu algumas recomendaçoes básicas que devem nortear a técnica do tratamento psicanalítico, como a associaçao livre, a abstinência, a neutralidade e a atençao flutuante. Dentre essas recomendaçoes ou regras, a única que foi nomeada como fundamental foi a associaçao livre. A regra fundamental é um princípio básico do método investigativo freudiano, que aplica de maneira sistemática a técnica da associaçao livre, desde o início de cada tratamento e durante todas as sessoes. A associaçao livre nao deve ser considerada como algo isolado do paciente, mas como um processo complexo que reflete a interaçao entre o analista e o paciente.

Freud estabeleceu uma das maneiras como o paciente deveria se comunicar, mas também definiu a forma de como o analista deveria conduzir a sua escuta, através da atençao flutuante. Se ao paciente caberia verbalizar tudo o que lhe ocorre, sem deixar de revelar algo que lhe pareça insignificante, constrangedor ou doloroso, ao analista caberia escutar o paciente de maneira o menos seletiva possível e o mais isento e livre de preconceitos. Para Bollas19, conforme preconizado por Freud, haveria uma comunicaçao do inconsciente do paciente para o inconsciente do analista e ambos os inconscientes poderiam provocar alteraçoes mútuas um no outro. Esse estado mental, caracterizado pela capacidade de olhar de determinada maneira a própria mente ou a do paciente, é a essência do contato psicanalítico.

Observa-se durante toda a sua obra sobre a regra fundamental que Freud ressaltava profundamente a necessidade da associaçao livre para os seus pacientes. Para Zimerman12, Freud impunha essa regra por meio de uma condiçao obrigatória na combinaçao inicial do contrato analítico, assim como por um constante incentivo às associaçoes de ideias no curso das sessoes. Penso, conforme aponta Soroka20, que o analista deve ter em mente que o paciente inevitavelmente terá resistências à associaçao livre ao longo do tratamento. A regra fundamental nao deve ter um tom desnecessariamente autoritário ou que sugira ao paciente que dele é esperado que cumpra exigências com as quais ele, inexoravelmente, pelo menos em algum momento do tratamento, nao será capaz de satisfazer. Inclusive, para Meltzer21, no início do processo psicanalítico, a regra fundamental nao é seguida, e a mesma é frequentemente mal apreendida sob a forma de "dizer tudo o que vem à mente". Esse autor refere esperar que os pacientes possam observar seus estados mentais e comunicar essas observaçoes, e que tal atitude nao seria possível com certa precisao ou consistência durante alguns anos. Nessa mesma linha, Bollas19 refere que a associaçao livre deve ser o método e a meta da psicanálise. Para esse autor, a associaçao livre ideal, em seu estado puro, é uma ficçao, pois se encontraria permanentemente comprometida pelas resistências do paciente. Dessa forma, penso também que a proposta à regra fundamental, apesar de ser comunicada no início do tratamento, possivelmente somente atingirá a sua real plenitude no decorrer do tratamento. Assim, podemos compreender a associaçao livre como um objetivo a ser conquistado e construído entre o analista e o paciente ao longo do processo terapêutico. Para tanto, é necessário também que o analista tenha como meta para si próprio o desenvolvimento da atençao flutuante e que assim possibilite que seu inconsciente possa estabelecer uma comunicaçao adequada com o inconsciente do paciente.

Cabe destacar, como afirma Mondrzak14, que na associaçao livre o paciente deve ser livre para omitir, censurar, distorcer, e que essa liberdade se mostra reveladora do funcionamento mental do paciente. Para Zimerman12, uma modificaçao que ocorreu ao longo do tempo é que a associaçao livre passou de uma imposiçao do analista a uma permissao ao analisando. Assim, é propiciado ao paciente um ambiente no qual possa realmente ser livre para recriar um novo espaço onde ele possa voltar a vivenciar antigas experiências emocionais, pensar, sentir, muitas vezes atuar e, acima de tudo, silenciar ou dizer tudo o que lhe vier à mente, no seu ritmo e à sua moda. Um discurso associativo aparentemente sem censuras, que corresponderia ao ideal de associaçao livre, poderia apenas significar um amontoado de palavras ligadas por qualquer critério aleatório e que teriam um sentido apenas defensivo e resistencial. Nesses casos, a verbalizaçao das ideias do paciente, por meio da associaçao livre, poderia estar sendo utilizada de uma forma muito mais "livre" do que realmente "associativa".

Ao longo do desenvolvimento de sua obra, Freud muitas vezes modificou suas formulaçoes, revisando conceitos e acrescentando dimensoes novas aos procedimentos técnicos. Porém, através deste trabalho, observou-se que, embora a técnica da associaçao livre tenha passado por diferentes descriçoes ao longo da obra de Freud, ela permaneceu praticamente inalterada e continuou sendo considerada um dos principais meios de acesso ao material inconsciente.


REFERENCIAS

1. Freud S. Publicaçoes pré-psicanalíticas e esboços inéditos (1888). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 1, p. 75-94.

2. Freud S. Uma breve descriçao da psicanálise (1924 [1923]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 19, p. 213-236.

3. Garcia-Rosa LA. Freud e o inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar; 1985.

4. Breuer J, Freud S. Estudos sobre a histeria (1893-1895). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 2, p. 13-339.

5. Freud S. Uma nota sobre a pré-história da psicanálise (1920). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 18, p. 271-273.

6. Freud S. A interpretaçao dos sonhos (1900). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 4, p. 14-363.

7. Bollas C. A questao infinita. Porto Alegre: Artmed; 2012.

8. Freud S. O método psicanalítico em Freud (1904 [1903]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 7, p. 233-240.

9. Freud S. Fragmento da análise de um caso de histeria (1905 [1901]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 7, p. 15-116.

10. Freud S. Cinco liçoes de psicanálise (1910). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 11, p. 15-65.

11. Freud S. A dinâmica da transferência (1912). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 12, p. 110-119.

12. Zimerman DE. Manual de técnica psicanalítica. Uma re-visao. Porto Alegre: Artmed; 2004.

13. Freud S. Recomendaçoes aos médicos que exercem a psicanálise (1912). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 12, p. 122-133.

14. Mondrzak VS. Recomendaçoes aos médicos que exercem a psicanálise: Freud 1912/Freud 2012. Rev Psicanal SPPA. 2012;19(1):215-25.

15. Freud S. Sobre o início do tratamento (1913). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 12, p. 136-171.

16. Freud S. Um estudo autobiográfico (1925 [1924]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 20, p. 10-74.

17. Freud S. Resistência e repressao (1916-1917 [1915-1917]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 16, p. 293-308.

18. Freud S. Inibiçoes, sintomas e ansiedade (1926 [1925]). In: Ediçao standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago; 1996. v. 20, p. 80-173.

19. Bollas C. Associaçao livre. Rio de Janeiro: Relume Dumará; 2005.

20. Soroka P. A técnica da associaçao livre revisitada: a regra fundamental da psicanálise à luz de diferentes concepçoes do processo analítico. Rev Psicanal SPPA. 1997;5(3):423-40.

21. Meltzer D. O processo psicanalítico (1967). Rio de Janeiro: Imago; 1971.










Psiquiatra e Psiquiatra da Infância e Adolescência. Mestre e Doutor em Psiquiatria. Membro aspirante da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre. Porto Alegre, RS, Brasil

Instituiçao: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre.

Correspondência
Luciano Isolan
Av. Taquara, 386/805
Porto Alegre/RS
isolan@cpovo.net

Submetido em: 21/12/2014
Aceito em: 11/05/2015

* Versao modificada e ampliada de trabalho publicado previamente nos Anais do VIII Simpósio Interno Integrado da Associaçao de Candidatos da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, 2014.

 

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