Rev. bras. psicoter. 2023; 25(3):115-133
Calixto AM, Mendes VC, Matias JP, Magalhães AMM, Pai DD, Camatta MW. Estratégias para o enfrentamento da ansiedade entre os trabalhadores de enfermagem na pandemia: revisão de escopo. Rev. bras. psicoter. 2023;25(3):115-133
Artigos de Revisao
Estratégias para o enfrentamento da ansiedade entre os trabalhadores de enfermagem na pandemia: revisão de escopo
Strategies for coping with anxiety among nursing workers during the pandemic: a scoping review
Estrategias para afrontar la ansiedad entre los trabajadores de enfermería durante la pandemia: revisión del alcance
Alessandra Mendes Calixto, Valentine Cogo Mendes, Juan Pablo Matias, Ana Maria Muller de Magalhães, Daiane Dal Pai, Marcio Wagner Camatta
Resumo
Abstract
Introdução
A doença provocada pelo coronavírus (COVID-19) se espalhou da China para todo o mundo em 2020, e desde então as equipes de saúde vêm enfrentando as consequências deste evento na linha de frente: serviços de saúde sobrecarregados, doenças respiratórias graves e muitos trabalhadores contaminados1. No último relatório de monitoramento dos casos de COVID-19 a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que aproximadamente 180 mil trabalhadores de saúde morreram em decorrência da contaminação2. Portanto, essa pandemia terá consequências de longo prazo que afetarão as políticas públicas de saúde nacionais e internacionais, impactando no adoecimento e morte de trabalhadores de enfermagem.
O número de morte de trabalhadores de enfermagem está sendo monitorado com preocupação global nesse período de pandemia. No Brasil, de acordo com dados do Observatório da Enfermagem3 foram registrados pelo Ministério da Saúde mais de 683 mil óbitos pela COVID-19 até agosto de 2022, sendo 872 trabalhadores de enfermagem morreram entre 2020 e 2022. Esses dados alarmantes reforçam o medo, sobretudo no período entre 2019 e 2020, quando ainda se vivia incertezas quanto à contaminação. Muitos trabalhadores de enfermagem relataram sintomas depressivos e de ansiedade nesse período4.
Os trabalhadores de saúde expostos ao COVID-19 apresentaram alto risco de desenvolver problemas emocionais e precisaram de intervenções em saúde mental5, assim como os trabalhadores de enfermagem, por ser uma das ocupações mais estressantes na área da saúde, mesmo em contextos não pandêmicos6. No cenário pandêmico, as intervenções em saúde mental tornam-se essenciais, sobretudo aquelas focadas em emoções (medo, ansiedade e raiva)5 mais prevalentes em contextos de alta exposição ao estresse.
Os serviços de saúde passaram a ser locais de extremo risco de contaminação para população em geral e trabalhadores de saúde, especialmente aos da enfermagem, uma vez que a atuação desses/as trabalhadores/ as é elemento central no enfrentamento da pandemia. Desse modo, além dos fatores de risco já existentes, esses trabalhadores passaram a receber mais esta sobrecarga de demanda no cotidiano laboral.
A exposição à alta demanda de pacientes, às mudanças no processo de trabalho e ao baixo apoio social estão associados a uma maior exposição ao estresse, sendo necessária a implementação de intervenções em saúde mental para os trabalhadores de saúde, tais como o apoio social no trabalho, a comunicação efetiva das medidas protetivas contra a contaminação, a orientação de manejo de ansiedade e o suporte psicológico para indivíduos sintomáticos ou vulneráveis5,7. Entretanto, há um pressuposto de que ainda não está claro que ações são realizadas pelos próprios trabalhadores de enfermagem ou que são implementadas por gestores para lidar com a ansiedade no trabalho na pandemia.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, na Etiópia houve um aumento de três vezes na predominância de sintomas de depressão em comparação com as estimativas deste país antes da epidemia. Na China, os profissionais de saúde relataram altas taxas de depressão (50%), ansiedade (45%) e insônia (34%) e, no Canadá, 47% dos profissionais de saúde reportaram a necessidade de suporte psicológico52. O aumento dos níveis de estresse, ansiedade e depressão, detectados durante a pandemia, revelou que os profissionais da saúde enfrentam enorme pressão, incluindo alto risco de infecção e proteção inadequada contra a contaminação, excesso de trabalho, isolamento, assistência a pacientes com emoções negativas, falta de contato com a família e, por fim, exaustão. A soma destes fatores contribuiu para que houvesse mais agravos à saúde mental53. No Brasil, dos 45.161 respondentes, 40,4% sentiram-se frequentemente deprimidos, 52,6% ansiosos, 43,5% relataram início de problemas de sono e 48% problemas de sono preexistentes e agravados. Esses sintomas mostraram-se mais presentes entre adultos jovens, mulheres e pessoas com antecedentes de depressão53 .
Um estudo aponta que profissionais que atuam em serviços privados, que possuem sintomas de Síndrome de Burnout, e que atuam em serviços sem estrutura para o enfrentamento da pandemia de COVID-19, possuem maiores prevalências de sintomas de ansiedade e depressão. Enquanto o hábito de ter conversas com amigos e familiares mostrou-se um fator que reduz a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão em profissionais de enfermagem, durante a pandemia de COVID-1951 .
Esta revisão de escopo busca levantar essas informações como forma de mapear os conhecimentos existentes para o autocuidado e para sensibilizar os gestores em saúde sobre as alternativas de implementação de intervenções em saúde mental para os trabalhadores de enfermagem, contribuindo assim para promoção da saúde do trabalhador. O objetivo deste estudo foi identificar as estratégias utilizadas para o manejo da ansiedade de trabalhadores de enfermagem na pandemia de COVID-19. Espera-se que este levantamento possa oferecer recomendações de estratégias de enfrentamento para diminuir a ansiedade na enfermagem.
Métodos
Trata-se de uma revisão de escopo baseada no Joanna Briggs Institute Reviewers'Manual8-9, buscando mapear estudos relevantes na literatura científica, tendo sido registrada na Plataforma Open Science Framework (OSF), com o identificador doi 10.17605/OSF.IO/B2K5V.
Foram seguidas as cinco etapas obrigatórias da revisão de escopo8-9: identificação da questão de pesquisa; identificação de estudos relevantes (critérios de inclusão); seleção dos estudos (estratégia de busca); extração dos resultados (mapeamento dos dados); e apresentação dos resultados (síntese e comunicação dos resultados).
A questão de pesquisa foi formulada a partir da estratégia mnemônica PCC8 (P: population - trabalhadores de enfermagem; C: concept - manejo da ansiedade; C: context - pandemia de COVID-19, sendo estabelecida a seguinte questão: Quais estratégias para o manejo da ansiedade de trabalhadores de enfermagem foram divulgadas na pandemia de COVID-19?
Para a seleção da amostra foram utilizados os seguintes critérios de elegibilidade: artigos originais, em português, espanhol ou inglês, sobre o manejo da ansiedade de trabalhadores de enfermagem na pandemia de COVID-19, publicados entre janeiro de 2020 e março de 2022. Foram excluídos os estudos de revisão, editoriais, reflexão temática, ensaios teóricos, teses, dissertações, livros, resumos e anais de evento.
Para identificação dos estudos, foi realizada busca no período de abril de 2022 nas seguintes bases de dados: Web of Science, SCOPUS, Excerpta Medica DataBASE, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SCIELO).
Como estratégia de busca utilizou-se a combinação dos seguintes descritores do Medical Subject Headings (MeSH) e/ou Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): (Anxiety) AND ("COVID-19") AND (Nursing OR Nurses) AND ("Coping Strategies"). Foram utilizados os termos correspondentes em inglês e português durante a busca que foi realizada. Nesta etapa, se realizou busca por pares com o intuito de garantir a confiabilidade no processo. Após a seleção das referências os artigos duplicados foram excluídos com a ajuda do software Mendeley®.
Para extração e análise dos dados dos estudos selecionados, utilizou-se um instrumento construído no Microsoft Word 2011, contendo informações de interesse da pesquisa (título, autores, ano e país de publicação, nome do periódico, objetivos, métodos, população/amostra, local do estudo, resultados, conclusões e nível de evidência).
O agrupamento dos resultados foi feito a partir de similaridade temática e semântica. Para extrair os dados e identificar as temáticas (estratégias de enfrentamento, trabalhadores de enfermagem e ansiedade), utilizou-se instrumento estruturado no Microsoft Excel, permitindo a sintetização, gerando uma descrição dos textos incluídos na revisão. Assim, procedeu-se à etapa de separação, sumarização e relatório de resultados com a intenção de apresentar uma visão geral de todo o material por meio de categorias temáticas que emergiram da análise: 1) Estratégias de manejo da ansiedade realizadas pelos trabalhadores de enfermagem; 2) Estratégias de manejo da ansiedade ofertadas pela gestão dos serviços de saúde para os trabalhadores de enfermagem.
Em relação aos aspectos éticos, não houve necessidade de apreciação de comitê de ética por ser um estudo de natureza bibliográfica à literatura, contudo ressalta-se que os direitos de autoria foram respeitados ao referenciar os autores dos estudos analisados.
Resultados
Os procedimentos de busca e inclusão dos estudos guiados pelas diretrizes do Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses (PRISMA) adaptado para Scoping Review8, conforme apresentado no fluxograma da figura 1. O refinamento da escolha dos estudos da amostra foi desde a sua identificação, leitura do título e resumos, e posteriormente da leitura na íntegra dos pré-selecionados.
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